Posso sair da sociedade limitada que sou sócio? Posso sair de forma imotivada ou devo alegar um motivo justo para deixar a empresa? Como sair da forma correta? Quais são as formalidades que devo seguir para que eu possa receber todos os meus direitos de sócio retirante?
No Brasil, existem basicamente 2 tipos de sociedades mais comuns que são utilizados pelos nossos empreendedores para montar algum negócio de maneira profissional. O primeiro tipo de sociedade que é chamado de “sociedade anônima”, que é tipo mais adequado para realizar empreendimentos que requerem maiores valores de investimentos ou maior número de sócios para viabilizar o desenvolvimento de determinada atividade. Exemplo: uma fábrica, uma indústria, um banco, e assim por diante, que demandam quantias mais elevadas de dinheiro. E um segundo tipo de sociedade que é chamado de “sociedade limitada”, e se refere a um tipo de sociedade mais adequado ao desenvolvimento de pequenas e médias empresas, que venham a exercer atividades de comércio, prestação de serviços ou produção de bens. Inclusive, esse segundo tipo das “sociedades limitadas” representa cerca de 95% do total das empresas no nosso país.
Bom, hoje vou tratar aqui especificamente sobre a saída de sócios da sociedade limitada que, como eu disse, representa 95% do universo das nossas empresas no Brasil.
Vamos lá! Para entender as regras, eu dividi o tema em 3 pontos de atenção.
Primeiro: Posso sair da sociedade que sou sócio? A resposta é sim! O entendimento atual dos nossos tribunais, incluindo o do Superior Tribunal de Justiça – STJ, lá em Brasília, é de que o sócio pode ser retirar a qualquer momento de uma sociedade que tenha o seu contrato firmado por prazo de indeterminado. Recentemente, agora em 2021, o nosso STJ manifestou de forma definitiva sobre essa questão e afirmou que qualquer sócio poderá se desvincular de uma sociedade limitada a qualquer momento, já que existe em nosso país um princípio previsto na Constituição Federal que diz que ninguém será obrigado a se vincular, contratar, ou se manter vinculado sem a sua vontade. Para que a saída a qualquer momento seja possível, o único requisito exigido pela lei e agora pelos Tribunais será o de que os sócios tenham contratado entre si uma sociedade por prazo indeterminado, ou seja, que a empresa tenha sido constituída pelos sócios não tenha um prazo fixo para início e término das suas atividades. Aliás, são raros os casos de empresa com o prazo fixo. A realidade de quase todas as empresas é um prazo indeterminado porque quando você abre um negócio, você provavelmente o abre pensando em tê-lo de forma perene, longa, com sucesso, crescimento, e sem prazo para terminar. E se este for o seu caso, você poderá deixar de ser sócio a qualquer momento.
Vamos ao segundo ponto: Posso sair de forma imotivada ou devo alegar um motivo justo para deixar a empresa?
Sim, você poderá sair de forma imotivada e a qualquer momento dentro de uma sociedade limitada. Esse ponto também se encontra hoje firme e consolidado pelos Tribunais. Caso você queira se retirar da empresa que é sócio, não precisará mais alegar um motivo justo, uma justa causa, ou algo que pudesse justificar de forma razoável o rompimento do contrato de sociedade que foi firmado entre você e seus sócios. Até então era muito comum a gente buscar um fato mais grave, mais tangível para justificar a saída de um sócio de forma unilateral. Esse motivo se referia muitas vezes à alguma mudança na estrutura interna ou gestão da sociedade que você discordava; ou algum investimento ou expansão que você não via sentido mas que foi voto vencido pela maioria; ou alguma briga ou desentendimento entre os sócios que tornava a relação desconfortável; ou a falta de distribuição de lucros por um longo período que contrariava os interesses do sócio como investidor e a finalidade da sociedade, enfim, era preciso se buscar algo para justificar essa atitude do sócio dentro das empresas limitadas.
Até porque existia também uma certa dúvida no meio jurídico se realmente a saída sem motivo era possível somente nas sociedades chamadas “simples”, que são aquelas sociedades de profissionais liberais (médicos, contadores, advogados, engenheiros) ou isso também poderia ser feito nas sociedades limitadas com qualquer tipo de sócio e qualquer espécie de atividade. Como expliquei, agora isso foi pacificado e se você é sócio de uma sociedade limitada poderá sim sair da sua empresa sem a necessidade da alegação de uma justa causa ou motivo grave para os seus demais sócios.
Vamos ao terceiro e último ponto: Como sair da forma correta? Quais são as formalidades que devo seguir para que eu possa receber todos os meus direitos de sócio retirante?
Primeira coisa que você deve fazer é verificar o contrato de sociedade que assinou com os seus sócios quando foi constituir a sua empresa. Pode ser que exista dentro do seu Contrato Social uma cláusula que explica como deve ser o comportamento do sócio que quiser se retirar da empresa. Se tiver esse item de forma expressa, você deve seguir a formalidade que está ali prevista para basicamente em 3 (três) atos conseguir resolver a sua retirada da sociedade: primeiro, realizar uma comunicação formal aos demais sócios e conceder o direito de preferência de compra aos demais sócios e sociedade; segundo, respeitar a forma de apuração, data base para cálculo e forma de pagamento do reembolso das suas cotas; e terceiro, providenciar dentro do prazo descrito a assinatura da alteração do Contrato Social e registro nos órgãos públicos da sua saída da empresa.
Mas se o seu Contrato Social não tiver essa previsão de forma escrita, ou se tiver mas não contemplar de forma clara algum dos 3 (três) pontos que mencionei, aí sugiro que você siga o seguinte passo a passo previsto na legislação com 5 (cinco) etapas. Primeiro, realize uma comunicação ou notificação por escrito aos seus sócios comunicando o seu interesse de saída, dando o prazo de 60 (sessenta) dias para que eles se manifestem sobre o interesse de compra das suas cotas, o interesse de continuidade ou não das atividades da sociedade, e, assinatura da alteração do Contrato Social para formalização da sua saída. Segundo, dentro desse prazo ou logo após, negocie com os seus sócios o critério de cálculo mais justo para a apuração do valor das suas cotas e metodologia mais adequada de acordo com o tipo de atividade do seu negócio para avaliar o patrimônio atual da empresa. Terceiro, combine a data que será considerada como “data base” para a apuração desses valores e dia da sua saída formal da sociedade, com efeitos jurídicos consequentes para todos. Quarto, negocie a forma de pagamento dos seus haveres de maneira que possa receber dentro de um prazo razoável o reembolso dos seus investimentos, à vista ou de forma parcelada, com ou sem alguma correção, mas também que isso não seja um fato que venha a gerar uma descapitalização excessiva na empresa ao ponto de criar dificuldades financeiras para que se possa continuar com suas atividades comerciais após a sua saída. Neste ponto, é preciso ter cautela e bom senso para equilibrar os interesses do sócio que se retira com aqueles interesses da empresa e de toda a sociedade na preservação da atividade econômica e todos os benefícios que são gerados a sua volta. E, por último, quinto ponto: acerte a assinatura da alteração do Contrato Social e leve a registro perante os órgãos públicos dentro do prazo máximo de 30 (trinta) dias para que fique formalizada a sua saída de forma pública e gere efeitos e limitações sobre as suas responsabilidades civis, tributárias e trabalhistas daqui para frente como ex-sócio.