Hoje vamos tratar de um conflito societário que chega ao nosso escritório de maneira muito frequente. E normalmente numa hora um pouco delicada, de fragilidade e tristeza. A dúvida é a seguinte: meu sócio faleceu, os herdeiros podem entrar na empresa? Ou então, quando é a própria família do falecido que nos procura, a dúvida é a mesma mas muda o enforque e ponto de vista: meu Pai ou minha Mãe faleceu, posso entrar na empresa? O que fazer quando um sócio falece? Como funciona a sucessão empresarial? Será que são as mesmas regras da sucessão hereditária?
De pronto, a primeira informação que eu quero te passar é a seguinte: “não”, as regras empresariais que regulamentam a sucessão sobre cotas e ações são um pouco diferentes daquelas aplicadas na sucessão de outros bens, tais como imóveis, carros, dinheiro, etc. As regras societárias que vamos tratar agora seguem o princípio básico do “consentimento”, o que significa dizer que, na sucessão, deve ser aplicado o que foi combinado anteriormente entre os sócios. Ou seja, é preciso respeitar o que foi negociado entre os sócios no início da sociedade e depois devidamente formalizado por meio contrato de sociedade justamente para retratar esse acordo de vontades.
Sendo assim, vamos falar primeiro das sociedades limitadas, que representam a maioria das empresas no nosso país. Nessas sociedades, com o falecimento de um dos sócios temos que em primeiro lugar verificar o que diz o contrato social da empresa. Antes de mais nada, o que você deve fazer é pegar o contrato social e ler todo esse contrato. Nós precisamos verificar se existe alguma cláusula, termo ou condição que trata sobre esse assunto. Normalmente, essa cláusula vem com o título: “do falecimento”. Se tiver qualquer dificuldade na leitura, procure um profissional da sua confiança dentro da área jurídica para te ajudar na leitura e compreensão do contrato.
Se nesse contrato estiver previsto que os herdeiros poderão entrar na empresa em caso de falecimento dos sócios, aí a nossa questão estará praticamente resolvida. Os herdeiros terão o direito de ingressar na sociedade em substituição ao sócio falecido, uma vez que isso foi acordado previamente entre os sócios. Nesta hipótese, será um direito do herdeiro decidir pelo ingresso ou não na sociedade daqui pra frente, até mesmo se o outro sócio sobrevivente mudar de ideia sobre a admissão dos herdeiros ou justificar que não tem afinidade com os herdeiros do seu ex-sócio falecido. Isso não poderá servir de justificativa para descumprir a cláusula existente e livremente acordada entre os sócios de forma anterior e dentro do livre consentimento. A cláusula deverá ser respeitada e a opção da sucessão empresarial será dos herdeiros, cabendo aos sucessores decidirem se querem ou não entrar na sociedade. E aqui, vai uma importante dica: antes de decidir, você que é herdeiro deve buscar levantar informações sobre a empresa, conversar com a administração atual e entender como está a saúde da empresa. Caso venha a se tornar sócio, você estará assumindo a empresa no estado em que se encontra, com as dívidas passadas e tudo mais que vier a ser feito no futuro.
Mas se eventualmente por qualquer motivo os herdeiros optarem por não ingressar na empresa, aí as suas cotas serão liquidadas e pagas conforme o valor a ser apurado com base numa avaliação que será feita pela empresa sobre o seu valor patrimonial, ativos a passivos, com base na data do falecimento do sócio.
Bom, essa situação ficou clara, não ficou? Mas, aí vem a seguinte dúvida: Matheus, e se o Contrato Social não prever nada? Se não tiver nada escrito a respeito do falecimento?
Neste caso, aí teremos que analisar 3 cenários possíveis para resolver essa situação.
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Voltando ao tema, infelizmente, todas as vezes que o empresário não planeja a sua atividade previamente, não regulamenta por escrito como irá desenvolver a sua atividade e também não combina por escrito como será a sua relação com os demais sócios, aí a gente abre espaço para Estado e a lei intervir para suprir essa lacuna. Nós deixamos uma brecha para que um terceiro, no caso o Juiz, possa intervir na relação privada entre os sócios e assim definir o que deve ser feito. Por isso é que eu sempre digo a vocês sobre a importância de se fazer um planejamento antes e principalmente ter uma consultoria jurídica da sua confiança antes de iniciar a sua atividade empresarial. Não use modelos prontos, não pegue o contrato da Junta comercial, não sai copiando as coisas sem orientação! Contrate uma pessoa da sua confiança para redigir o seu contrato social, te orientar e ajudar a prever determinadas situações por escrito.
Mas por que eu estou dizendo isso? Estou querendo chamar sua atenção para o seguinte: na omissão do Contrato Social, isto é, na ausência de uma cláusula específica que trate da situação do falecimento entre os sócios e garanta aos herdeiros a possibilidade de ingressar na empresa, a nossa lei diz que deve ser aplicado o Código Civil. Isso mesmo, a nossa lei diz que devemos obrigatoriamente seguir o Código Civil que, por sua vez, impõe 3 (três) situações para resolvermos esse problema.
Primeiro, já que o Contrato Social é omisso, o direito de decidir o que fazer passa a ser então dos sócios sobreviventes. São eles que passarão a ter o poder de decidir se aceitarão ou não a entrada dos herdeiros do sócio falecido na empresa. Se os sócios atuais não quiserem por qualquer motivo aceitar os herdeiros, aí os sucessores somente terão o direito de receber o valor patrimonial correspondente as cotas do seu pai ou mãe. Será feita a compra ou liquidação forçada das quotas do sócio falecido pela empresa e os herdeiros terão o direito ao recebimento do valor patrimonial das cotas como crédito junto a sociedade. Será feita a avaliação das cotas e o posterior pagamento desse valor dentre das condições previstas no contrato social (caso exista pelo menos essa disposição sobre as condições de pagamento em caso de saída de algum sócio), ou, então, dentro do prazo de até 90 dias, em uma parcela, após essa apuração desse valor pela sociedade, tal qual está disposto no Código Civil. Veja a diferença: os herdeiros não terão mais o direito de continuar com a sociedade no lugar do sócio falecido, mas tão somente o direito de receber o seu crédito das cotas do sócio falecido.
Segundo, já que o Contrato é omisso, os sócios sobreviventes terão o direito encerrar as atividades da empresa. Diante do falecimento do sócio, os demais sócios poderão manifestar que não desejam mais prosseguir com a empresa e providenciar a liquidação de todos os ativos e pagamentos dos passivos. Ou seja, a empresa será dissolvida e liquidada por vontade da maioria dos sócios sobreviventes, independentemente da vontade dos herdeiros. Qual será o direito dos herdeiros? Eles continuarão com o direito de receber o seu crédito correspondente ao valor patrimonial das cotas do sócio falecido que, agora, deverá representar o eventual saldo remanescente que os sócios terão direito numa futura partilha caso venha a sobrar algum valor após a liquidação total da empresa. Enfim, ainda nessa hipótese é importante perceber que a decisão será dos sócios sobreviventes, mas não dos herdeiros.
E a terceira e última situação, é a seguinte: os sócios sobreviventes aceitam a substituição do sócio falecido. Isso poderá ser feito pela aceitação do ingresso dos próprios herdeiros na sociedade ou então com a aceitação de que os herdeiros vendam a participação do sócio falecido para um terceiro. Essa terceira pessoa que deverá ser previamente identificada e aceita pelos sócios atuais, que devem assim concordar e aprovar o ingresso dessa terceira pessoa a princípio estranha na sociedade. Veja, será necessário respeitar a vontade dos sócios atuais e o poder de decisão continua com eles sobre aceitar ou não a substituição do sócio falecido.
Bom, essas são as alternativas que a lei nos traz. Se você achou justa, que bom que está de acordo. Mas se você não gostou, trate de olhar agora o que diz o seu Contrato Social e passe a regulamentar por escrito de forma preventiva qual solução você quer para esse problema. Trata de inserir uma cláusula específica para dizer agora como que você quer que seja resolvida essa situação no futuro!
E por último, nas sociedades anônimas esse conflito é menor. Em regra vigora o princípio da livre transmissibilidade das ações e, em caso de falecimento, as ações são transferidas aos seus herdeiros que passam, em razão da sucessão, a serem acionistas da empresa. Caso venha a existir alguma restrição no Estatuto Social sobre a livre circulação das ações, aí teremos que analisar caso a caso o que fazer e qual o tratamento jurídico adotar.