Governança Jurídica por Matheus Bonaccorsi – Testamento: será que eu devo fazer?

Testamento! Você sabe para que serve? Quais são as matérias, os assuntos e as cláusulas que podem ser tratadas dentro de um testamento? Gostaria de saber como ele pode te ajudar a resolver os seus problemas?

O que é um testamento? O testamento é uma declaração de vontade. É um ato pessoal que tem validade jurídica, criando direitos e obrigações para serem satisfeitas após a sua morte. Por isso dizemos que é um ato jurídico de “última vontade”, já que os seus efeitos virão a ter repercussão no mundo jurídico após o seu falecimento.

Quem pode fazer um testamento? Pela nossa legislação, qualquer pessoa que seja considerada “capaz” do ponto de vista civil pode utilizar esse instrumento jurídico. Em tese, todos aqueles que são maiores de 18 anos estão aptos para fazer um testamento, desde que não seja interditado esteja sob curatela. Mas a lei também abre uma exceção em favor dos maiores de 16 anos, permitindo que essas pessoas possam também fazer testamentos. No que se refere às pessoas maiores com alguma necessidade especial, como por exemplo um cego, surdo ou mudo, é perfeitamente possível que tais pessoas também façam um testamento válido, sendo necessário apenas algumas pequenas particularidades e cuidados.

Quais são os tipos testamento? A lei prevê três modalidades de testamento: o “público”, que é aquele feito no Cartório de Notas perante um Notário com fé pública; o testamento “particular” que é feito pela própria pessoa na presença de, pelo menos, 3 (três) testemunhas; e por último o testamento chamado de “cerrado”, que é aquele feito pela pessoa e entregue na presença de 2 (duas) testemunhas ao Cartório para sua guarda em sigilo e abertura após o falecimento.

Mas provavelmente você deve estar se perguntando: Matheus, entendi o conceito. Mas por que eu faria um testamento? Qual seria a utilidade prática de um testamento na minha vida?

Nesse ponto é que eu gostaria que você prestasse a atenção! Vou te dar apresentar algumas finalidades e exemplos de como o testamento poderá ser útil aí no seu planejamento patrimonial e familiar. Fique atento!

Primeiro, para a “doação de bens”: via de regra, o testador só pode dispor sobre metade de seu patrimônio porque a outra metade que corresponde à chamada “parte legítima” deve ser destinada aos herdeiros chamados de “necessários”, que são os descendentes, ascendentes, cônjuge ou companheiro. Sendo assim, caso você queira favorecer um ou mais desses herdeiros necessários com uma cota maior em relação à cota dos demais, ou ainda, caso você queira favorecer um terceiro que não seja herdeiro com algum bem do seu patrimônio, você pode utilizar o testamento como instrumento para fazer isso legalmente e assegurar que seja cumprida essa destinação aos bens após a sua morte. Isso pode acontecer não só porque você eventualmente acha que um herdeiro seja por mérito mais merecedor do que o outro, como também você pode utilizar como um mecanismo de proteção ao querer, por exemplo, proteger um filho especial, ou dar melhores condições a um herdeiro doente, ou então, privilegiar simplesmente aquele que, por algum motivo, precisa mais do que os outros.

Uma outra finalidade muito útil: minimizar brigas e discussões a respeito da destinação de cada um dos bens entre os herdeiros necessários. Se você que é Pai, Mãe, marido ou esposa e conhece bem a sua família e sabe dos potenciais conflitos, você pode dividir os bens via testamento de tal maneira que você mesmo faça a escolha de quais bens cada um dos herdeiros vai receber, evitando assim brigas futuras. Neste caso, o importante é apenas respeitar que, ao final, o valor de cada quinhão, cota parte destinada aos herdeiros necessários seja igual em termos de valor.

Outra finalidade: estipular legados. Isso significa que você quer doar algum bem específico para alguém que não seja seu herdeiro. Esses bens de valor podem ser imóveis, carros, jóias, obras de arte, livros, direitos autorais, etc. que será destinado a alguém definido por você. À esse bem móvel ou imóvel destinado para alguma finalidade chamamos de “legado”. Sendo assim, você poderá com essa ferramenta jurídica favorecer um amigo querido, um cuidador, uma igreja, uma instituição de caridade, um museu, uma biblioteca, uma instituição de ensino, e por aí vai uma infinidade de possibilidades de destinações saudáveis e altruístas que se tornam viáveis por meio do testamento.

Mais uma utilidade: pelo testamento é também possível deixar o usufruto de um bem determinado, que pode ser um bem móvel ou imóvel em favor de alguém, como uma casa, apartamento ou sala comercial, por exemplo. Isso pode ser útil na medida em que o bem será destinado aos herdeiros, na partilha, mas esse bem poderá favorecer um terceiro que passará a ter o direito de usar e fruir (receber aluguéis, por exemplo) por um prazo determinado ou de forma vitalícia. É como a gente diz aqui em Minas, vou matar 2 coelhos com um tiro só. Traduzindo: atingir 2 finalidades com um só instrumento, no caso o testamento.

Além disso, uma outra finalidade é estipular o “legado de alimentos”, que seria o pagamento de uma quantia mensal a alguém, seja ele maior ou menor de idade, com a utilização da herança. Neste caso, os herdeiros ficarão responsáveis por cumprir o encargo de pagar essa pensão em favor de um terceiro, utilizando para isso a administração dos bens e os rendimentos advindos da própria herança deixada pelo testador.

Bom, até agora falamos muito de patrimônio e questões financeiras. Mas eu gostaria de te lembrar que o testamento pode também ser utilizado para definir questões não patrimoniais. Você sabia? Veja comigo 3 (três) questões muito interessantes da nossa vida cotidiana.

A primeira delas de cunho extrapatrimonial é a designação, por testamento, de um tutor para o filho menor. Se os Pais verificarem que um filho menor pode ficar desemparado, é possível definir que na falta dos Pais uma pessoa específica dentre os parentes fique como responsável direto pela criação dos filhos. Embora essa disposição venha a ser objeto de análise posterior pelo juiz (que levará em consideração o melhor interesse da criança para definir quem será o seu tutor), certamente essa nomeação será um elemento importante para que o Juiz possa entender a convicção e compreender a vontade dos Pais.

Uma segunda utilidade é o reconhecimento de filhos. O testamento pode ser utilizado como documento hábil para formalizar o reconhecimento de um filho ainda não reconhecido. Esse reconhecimento produz efeitos imediatos e pode vir a evitar injustiças com um filho após a morte dos Pais. Filhos esses que por vezes já sofreram em vida justamente por terem sido renegados em vida mas que agora, ainda que de forma tardia (após a morte do Pai ou Mãe), vêm a ser reconhecidos e com isso legitimados a receber os direitos de herança. Realmente, é uma situação triste, que ainda acontece no presente apesar de ter sido muito mais comum no passado, e que o direito em sua plenitude acaba por nos prover de instrumentos jurídicos para sanar erros e corrigir injustiças. Eu sempre digo: antes tarde do que nunca, não é mesmo?

E por último, gostaria dizer sobre a possibilidade de doação de órgãos e tecidos para fins de pesquisa ou criogenização por meio do testamento. Caso seja da sua vontade, você poderá deixar registrado a destinação do seu corpo para esses fins específicos após a sua morte.

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