DOAÇÃO DE BENS: EXISTE GANHO DE CAPITAL E IMPOSTO DE RENDA?

“Doação de bens”, especificamente para abordar e esclarecer a seguinte questão tributária: além do ITCMD de competência estadual que incide sobre as doações, existe a incidência de Imposto de Renda de competência federal sobre a doação de bens? E se a doação for realizada pelo valor atualizado do bem, existe ganho de capital por parte do doador? A atualização do valor do bem doado significa acréscimo patrimonial em favor do doador passível de tributação sobre o ganho de capital?

Esse aspecto tributário gera bastante dúvidas no momento da definição dos valores financeiros que serão atribuídos aos bens doados. O doador fica em dúvida se deve transferir os bens doados pelo valor constante na sua Declaração de Ajuste Anual de Imposto de Renda – DIRPF, ou se deve transferir os bens doados pelo valor atualizado de mercado. Essa análise financeira com a definição dos valores dos bens doados é muito importante de ser planejada pela família, especialmente quando a doação é realizada de pais para filhos. Nestes casos em que a doação envolve herdeiros, os valores dos bens são relevantes porque esse ato poderá representar ou não uma antecipação da parte legítima da herança em favor do herdeiro, conforme já expliquei em outro vídeo específico aqui no canal. Para esclarecermos as dúvidas sobre a incidência ou não do Imposto de Renda na doação de bens, vou explicar por partes as questões tributárias envolvidas para que possa ficar claro e ao final concluirmos juntos o raciocínio jurídico. Em primeiro lugar, cabe relembrar que a nossa Constituição Federal/88 repartiu o poder de tributar entre os entes federados (Governo Federal, Estados e Municípios), introduzindo regras constitucionais que definem os tributos de acordo com os fatos e materialidades tributárias. Esse modelo visa justamente a impedir que um mesmo fato venha a concentrar mais de uma incidência de impostos, seja a dupla incidência feita por um mesmo ente federativo (princípio que chamamos de “vedação ao bis in idem”), ou seja a dupla incidência feita por entes federativos diversos (princípio que denominamos “vedação à bitributação”). Dentro dessa repartição, o art. 155, III da Constituição Federal/88 já definiu como atribuição dos Estados a cobrança do imposto sobre a transmissão de bens por causa mortis (falecimento) e doação (ITCMD). Em segundo lugar, cumpre esclarecer com base no art. 153, II da Constituição Federal/88 que o imposto sobre a renda é de competência federal e deve incidir sobre o acréscimo patrimonial disponível econômica ou juridicamente. Inclusive, o Supremo Tribunal Federal por meio do Recurso Extraordinário nº 172.058 possui o entendimento consolidado no sentido de que o fato gerador do imposto de renda é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de acréscimo patrimonial por parte da pessoa. Com base nessas premissas jurídicas, podemos agora analisar o ato de doação em si sob o aspecto do doador. Na doação de bens, o patrimônio do doador diminui, em vez de aumentar. Mesmo nos casos em que a doação é feita pelo valor atualizado de mercado, o patrimônio do doador sobre uma diminuição de disponibilidade em razão da transferência gratuita de bens em favor de terceiros. Dentro da perspectiva do doador, o ato de doação não gera para ele um acréscimo patrimonial ou aumento da disponibilidade de bens, passível assim de configurar um fato gerador do pagamento de imposto de renda. Portanto, a doação de bens não gera para o doador qualquer tipo de acréscimo patrimonial, e por isso, essa operação deve ser isenta da incidência de imposto de renda. O art. 3°, § 3°, da Lei n° 7.713/88 e o art. 23, §1 e 2, I da Lei nº 9.532/97 são inconstitucionais porque preveem a incidência do Imposto de Renda sobre ganhos de capital do doador no ato da doação (fato que configura “bitributação”). Essas disposições conflitam também com o art. 22, III, da própria Lei n° 7.713/88 que exclui do ganho de capital as transferências causa mortis e das doações em adiantamento de legítima, bem como com o art. 43, II do CTN que define os fatos geradores do Imposto de Renda. Inclusive, o STF já se manifestou a respeito no Agravo em Recurso Extraordinário 1.387.761. Fique atento para não pagar tributo indevido na doação!

SUCESSÃO ENTRE CÔNJUGES SEPARADO DE FATO

“Separação” entre cônjuges, especificamente da situação transitória que chamamos de “separação de fato” que significa que o casal se separou (ou seja, na prática não estão mais vivendo juntos em comunhão), mas ainda oficializou essa situação sob o aspecto jurídico por meio da separação judicial ou do divórcio. Eu te pergunto: será que neste caso, o cônjuge que está separado de fato tem direito sucessório sobre o patrimônio do outro? Caso nesse intervalo um dos cônjuges venha a falecer, o cônjuge separado de fato será herdeiro do falecido? Como fica essa situação perante a legislação e jurisprudência?

Para entender esse caso sob o aspecto sucessório, cabe lembrar que desde 2020 o nosso atual Código Civil elevou o cônjuge à condição de herdeiro necessário conforme os arts. 1.829 e 1.845. O marido ou esposa que fica vivo, terá direito sucessório sobre os bens individuais do falecido que são aqueles que não estão sujeitos à meação. O cônjuge sobrevivente concorrerá à herança em conjunto com os filhos vivos ou pais vivos do cônjuge falecido. Se a família tiver mais de 3 filhos, o cônjuge sobrevivente terá direito a, no mínimo, uma porção do patrimônio equivalente a 25% dessa herança. Isso acontece em todos os regimes de casamento, à exceção somente se o casal tiver submetido ao regime de separação obrigatória de bens imposto pelo art. 1.641 do Código Civil. Portanto, sendo o cônjuge sobrevivente em regra um dos herdeiros do falecido, temos que analisar como fica a situação nos casos em que o casal já estiver separado de fato. A nossa legislação tem uma regra específica disposta no art. 1.830 do Código Civil que diz o seguinte: “Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.” Ou seja, a lei diz que se o casal estiver separado de fato há menos de 2 (dois) anos, o cônjuge sobrevivente será herdeiro do falecido. Mas se o casal estiver separado há mais de 2 (dois) anos, o cônjuge sobrevivente não fará jus a sua condição de herdeiro. Ocorre que, os nossos Tribunais vêm entendendo de maneira diferente e dando uma interpretação diversa sobre o art. 1.830 do Código Civil. Recentemente tivemos uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo no Agravo de Instrumento nº 2020437- 62.2022.8.26.0000, em que se entendeu que o direito sucessório cessa no momento da separação de fato do casal porque, cada um, passa a formar patrimônio distinto após a separação. Nesse julgamento, o TJSP afirmou que “Com efeito, embora a literalidade do artigo 1.830 do Código Civil permita ao cônjuge supérstite separado de fato há menos de dois anos participar da sucessão do outro, a própria doutrina e jurisprudência vem reconhecendo que o direito sucessório cessa no momento da separação de fato. Nesta senda, a jurisprudência tem se posicionado no sentido de que uma vez cessada a vida em comum, inexistem interesses recíprocos, deixando de prevalecer a presunção de colaboração, comunhão e afetividade recíprocas entre os cônjuges”. Portanto, daqui em diante é importante ficarmos atentos sobre essa nova interpretação do . Essa discussão possivelmente deverá chegar no Superior Tribunal de Justiça – STJ que irá pacificar o tema. Mas pelo rumo atual da jurisprudência é possível que venhamos a ter uma interpretação restritiva da legislação sobre o direito sucessório do cônjuge separado de fato, com entendimento de que cessa a sua condição de herdeiro com a demonstração da ocorrência da separação de fato entre o casal.

FILHO QUE RECEBEU DOAÇÃO DOS PAIS TEM DIREITO AO RESTANTE DA HERANÇA?

Hoje iremos voltar a tratar do tema “doação de bens”. Vamos esclarecer uma dúvida específica e muito interessante de uma internauta que é a seguinte: um filho que já recebeu uma parte do patrimônio em vida por doação dos Pais tem direito a participar do restante dos bens advindos de herança após o falecimento dos Pais? Esse filho beneficiado pelos Pais em vida tem direito a participar do restante do patrimônio? Essa participação seria menor ou igual à dos demais filhos que não receberam nada em vida?

Essa internauta estava muito indignada porque na família dela um irmão tinha recebido dos seus Pais um imóvel (apartamento) por doação em vida e agora, após o falecimento dos Pais, pleiteava ter uma participação igual aos irmãos sobre os demais da herança, desconsiderando o fato de já ter sido beneficiado em vida. Essa situação é muito comum e nós precisamos entender como funcionam as regras da “doação em vida” dentro da nossa legislação. Conforme dispõe o art. 538 do Código Civil, a “doação de bens é um ato de liberalidade feito por alguém (chamado de “doador”) em benefício de uma outra pessoa (chamada de “donatária”). Caso a doação seja feita entre Pais e filhos, ela será considerada pela legislação como, em regra, um ato que implica em adiantamento de parte da futura herança dos filhos. Os bens doados em vida pelos Pais a favor dos filhos serão normalmente considerados como antecipação de parte da herança. Se os Pais não disserem nada a respeito no ato da doação, a legislação presume que o herdeiro recebeu o bem doado como uma parcela do patrimônio advindo da “parte legítima da herança” reservada aos herdeiros necessários, nos termos do art. 544 do Código Civil. A parte chamada “parte legítima da herança” corresponde ao percentual de 50% do patrimônio dos Pais que deve ser reservado aos herdeiros necessários que são os filhos, ascendentes e o cônjuge de acordo com o art. 1.845 do Código Civil. No exemplo trazido pela internauta, se os Pais não tiverem dito nada no momento da doação do apartamento ao filho, o bem imóvel que já foi recebido em vida pelo irmão será considerado como adiantamento da “parte legítima da herança” e por isso deverá ser descontado da partilha dos bens por meio de um procedimento chamado de “colação”. A “colação” é feita dentro do procedimento de inventário, com o objetivo de igualar os valores dos quinhões de cada herdeiro para que todos recebem exatamente o mesmo valor de herança, sem distinção. Ocorre que, se os Pais tiverem dito no ato da doação que o apartamento doado em vida a favor de apenas um dos filhos advém da “parte disponível da herança”, o bem imóvel recebido pelo filho em vida não será considerado como adiantamento da herança. Os Pais poderão ter deixado isso por escrito no ato da doação e demonstrado que o bem doado é proveniente da parte disponível do seu patrimônio em cumprimento ao disposto no art. 2.005 do Código Civil. Por consequência, nessa hipótese todo o restante do patrimônio dos Pais deverá ser dividido igualmente entre os herdeiros, sem considerar o apartamento já recebido em vida por somente um dos filhos. No procedimento de inventário dos Pais, não será mais necessário realizar o ato de “colação” de bens e nem igualar os valores dos quinhões dos herdeiros calculando-se os valores dos bens e direitos eventualmente recebidos em vida por algum dos filhos. Portanto, isso significa dizer que um filho poderá sim ser beneficiado em vida por doação de alguns bens dos Pais e, ainda assim, ter direito de participar de forma igualitária com os outros irmãos sobre os demais bens do patrimônio que compõem o restante da herança dos Pais.

A PARTE DOS HERDEIROS (LEGÍTIMA) NO TESTAMENTO

Hoje iremos tratar de um outro aspecto importante sobre testamento que se refere aos “herdeiros necessários” listados no art. 1.845 do Código Civil, ou seja, quando o testador possui descendentes, os ascendentes ou cônjuge vivos. Neste caso, os herdeiros necessários têm garantido por lei uma participação mínima de 50% sobre os bens do testador, que é chamada de “parte legítima da herança” conforme dispõe o art. 1.846 do Código Civil.

Por isso, surge uma dúvida no momento da confecção do testamento que é a seguinte: será que o testador poderá inserir no testamento disposições para organizar, gravar e estruturar a sucessão de bens que fazem parte da parte legítima da herança (que são os 50% indisponíveis), ou será que o testador somente poderá regulamentar no testamento questões sobre bens pertencentes à parte disponível do seu patrimônio? Essa é uma dúvida muito recorrente e advém de uma interpretação literal que pode ser dada sobre o artigo 1.857, parágrafo 1º, do Código Civil. A redação desse artigo diz literalmente o seguinte: “Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte. § 1. A legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída no testamento.” Ocorre que, o artigo 1.857, parágrafo 1º não deve ser analisado de maneira isolada. Esse artigo deve ser interpretado de forma sistemática e em conjunto com as demais normas que regulam o direito sucessório dentro do Código Civil. A nossa legislação dá total proteção aos herdeiros necessários por meio da reserva da “parte legítima da herança” equivalente a 50% do patrimônio no momento da morte que se dá a abertura da sucessão. Mas por outro lado, a legislação também confere ao autor da herança a necessária liberdade de dispor dos seus bens, dentro dos limites legais. Diante desses dois princípios norteadores nada impede que a parte indisponível do patrimônio destinada aos herdeiros necessários seja referida na escritura pública de testamento pelo autor da herança, desde observe os limites legais. As disposições testamentárias destinadas organizar, gravar e estruturar o patrimônio podem regulamentar todos os bens da herança, contando que evidentemente não implique em redução da parcela que a lei destina aos herdeiros necessários. Em outras palavras, a parte legítima dos herdeiros necessários poderá ser incluída no testamento, especialmente nas hipóteses em que o autor da herança pretenda, em vida e desde logo, organizar, gravar e estruturar a sucessão, devendo destinar a metade indisponível, ou mais, aos herdeiros necessários.

PRODUTOR RURAL: CUIDADO COM A SUCESSÃO DOS SEUS IMÓVEIS

Todos nós sabemos que o agro brasileiro evoluiu de tal forma que fez com que a produção rural deixasse de ser apenas aquela exercida por pequenos agricultores e suas famílias, para incluir, também, grandes produtores que exploram milhares de hectares de terra, empregam centenas de pessoas, giram investimentos na casa dos muitos milhões de reais anualmente, e ainda, destinam a produção não só para o mercado interno como também boa parte para o exterior ajudando na balança comercial do país.

Ocorre que, apesar dessa evolução sobre a produção e mercado, ao mesmo tempo vivemos um paradoxo dentro do agronegócio que recai sobre o produtor rural quando observado individualmente. Talvez por uma questão cultural, conseguimos perceber que boa parte dos produtores rurais exercem suas atividades rurais sem 3 (três) preocupações jurídicas fundamentais para a sustentabilidade do seu negócio entre as gerações, de pai para filhos e netos: 1) primeiro, o produtor brasileiro geralmente não busca qualquer nível de proteção jurídica sobre a sua pessoa física ou sobre o seu patrimônio particular já conquistado;
2) segundo, exerce suas atividades sem pensar na sucessão patrimonial, estruturas de governança e conservação desse patrimônio dentro da família ao longos das gerações;
3) terceiro, não planeja uma eficiência tributária no pagamento dos seus impostos, seja na pessoa física ou por meio de uma pessoa jurídica, com vistas a diminuir de forma lícita a alta carga tributária do país que recai sobre a produção.

Por isso, quero compartilhar alguns problemas que o produtor rural pode vir a enfrentar pela falta de planejamento patrimonial e sucessório. Geralmente, as terras rurais e o empreendimento rural estão registradas em nome da pessoa física do produtor rural. Do ponto de vista jurídico, isso poderá trazer consequências indesejáveis no âmbito familiar, econômico e sucessório. O falecimento do produtor rural será fonte de inúmeros problemas aos seus sucessores, que inclusive terão que contar com a participação de “agregados” da família (genros e noras) para qualquer decisão sobre os imóveis. Isso porque, seguindo a ordem natural e ditames da nossa legislação sucessória, a transferência dos imóveis na pessoa física por causa mortis fará com que todos os herdeiros venham a se tornar coproprietários dos imóveis rurais, em condomínio. A partir daí, será necessário contar com o acordo unânime de todos para tomada de qualquer decisão sobre as terras. Ou seja, a família terá que buscar sempre um consenso unânime de todos os proprietários para assuntos que afetem a propriedade do bem e vão além da sua mera administração, incluindo temas delicados como por exemplo:
1) permitir a continuidade da sua exploração como finalidade principal;
2) dar em garantia o imóvel para obtenção de empréstimos e linhas de créditos mais baratas;
3) impedir a eventual intenção de desembramento do terreno em frações menores por algum dos herdeiros;
4) evitar interesse de venda por um ou mais herdeiros, seja de parte ou de todo o imóvel. Nesses casos, a simples discordância de um único herdeiro poderá vir a impedir a celebração de um negócio jurídico que seja mais favorável para todos da família. Não bastasse, além disso será necessário buscar a outorga conjugal para aqueles herdeiros que estejam casados sob o regime de comunhão total ou comunhão parcial, ou para aqueles que estejam vivendo um relacionamento de união estável não formalizada ou formalizada e regida por um desses citados regimes patrimoniais. A outorga conjugal do genro ou da nora (isto é, dos “agregados” da família) será necessária mesmo que essa herança tenda sido adquirida antes do casamento ou união estável por herança ou até mesmo por doação. Se no momento do ato o herdeiro estiver com vivendo o relacionamento conjugal, deverá buscar a autorização conjugal para a prática do ato que envolva o imóvel da família. A única exceção será se o herdeiro eventualmente tiver optado de maneira expressa e formal pelo regime patrimonial da separação absoluta de bens para o seu relacionamento. Tudo isso é uma exigência da lei prevista no art. 1.647 do Código Civil que diz que nenhum dos cônjuges poderá, sem autorização do outro, praticar os seguintes atos que envolvam imóveis:
1) primeiro, alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
2) segundo, pleitear, como autor ou réu, direitos acerca desses bens;
3) terceiro, prestar fiança ou aval;
4) quarto, fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Por isso, produtor rural tome cuidado todas essas questões jurídicas! Existem ferramentas para impedir todos esses problemas. Faça o planejamento patrimonial e sucessório dos seus bens e do empreendimento rural!

JUSTIÇA NEGA ANULAÇÃO DO PACTO ANTENUPCIAL

Hoje iremos tratar de um tema de direito de família que interessa a todos que estão casados e optaram pelo regime patrimonial da comunhão total bens, separação total ou participação final dos aquestos. Trata-se da validade jurídica da escolha do regime de casamento que é manifestada pelo casal no ato da lavratura do pacto antenupcial perante o Cartório. Recentemente, tivemos uma discussão na Justiça em que o Tribunal de Justiça do Amapá negou o pedido de uma ex-esposa que pretendia anular o pacto antenupcial do seu casamento sob a alegação de que o ex-marido teria decidido individualmente pelo regime de separação de bens, vindo ao final do casamento a ficar com todos os bens do casal porque estavam em nome apenas do ex-marido. Eu te pergunto: será que é possível anular a escolha do regime de casamento que foi feita lá atrás no momento da habilitação? O pacto será válido mesmo se, ao final do casamento, somente um dos cônjuges permanecer com todos os bens? Quais são os requisitos para a validade jurídica do pacto pré-nupcial firmado entre as Partes?

O caso que iremos utilizar de exemplo se refere à Apelação Cível nº 720211.2016.8.030001. Os fatos envolvendo esse caso são os seguintes: uma ex-mulher alegou que no momento da celebração do seu casamento ela foi induzida a erro e que houve vício seu consentimento no firmamento do pacto antenupcial, uma vez que o marido é quem teria, de forma individual e não conjunta, decidido pela escolha do regime patrimonial da separação total de bens para reger o seu casamento. A mulher explicou que, no início do casamento, o casal não tinha patrimônio, mas no término do relacionamento os bens móveis e imóveis que tinham sido adquiridos por ambos na constância do casamento ficaram todos somente com o ex-marido porque estavam exclusivamente em seu nome. Diante desses fatos, a ex-mulher sustentou que os bens tinham sido adquiridos com esforço comum do casal e pleiteou o reconhecimento da ineficácia do pacto antenupcial e do regime da separação total de bens, com a consequente partilha dos bens adquiridos segundo os princípios do regime geral da comunhão parcial de bens (ou seja, 50% para cada cônjuge). Ocorre que a Justiça não acatou os seus pedidos. O Tribunal do Amapá entendeu que o pacto antenupcial era inteiramente válido porque não restou comprovado qualquer vício de vontade capaz de anular o negócio jurídico, tendo em vista que o documento foi documentado por escritura pública devidamente assinada pelas partes perante tabelião, que por sua vez atestou fé pública sobre a livre e consciente manifestação de vontade das partes. O pacto antenupcial em questão foi firmado por pessoas maiores, capazes, de forma solene por escritura pública e dispôs sobre o objeto lícito que foi a escolha do regime de casamento. Ou seja, todos os requisitos e condições dos arts. 166, 171 e 1.640 do Código Civil foram respeitados, sem a demonstração da ocorrência de qualquer vício de vontade. O fato da ex-mulher ter se decepcionado com o ex-marido durante o casamento e o relacionamento chegado ao fim não torna o pacto antenupcial nulo ou anulável porque esse sentimento atual não invalida a expressão de vontade que tinha sido manifestada por ela lá atrás no momento da celebração do casamento e assinatura do contrato de casamento.

HOLDING RURAL: QUAIS AS VANTAGENS?

Hoje iremos tratar do tema holding rural, a fim de te apresentar algumas das vantagens mais comuns que essa ferramenta jurídica pode apresentar para o planejamento patrimonial, sucessório e tributário do produtor rural. Vou te apresentar algumas possibilidades de utilização da holding rural, mas é importante que se diga que cada caso é um caso, devendo sempre se verificar no caso específico daquela família se fará sentido ou não utilizar a holding rural como instrumento jurídico de planejamento.

A holding rural pode vir a apresentar várias vantagens ao produtor rural. Em alguns casos, será inclusive recomendável a utilização de uma ou mais holdings para que seja possível separar de forma segura o patrimônio empresarial alocado para a exploração das atividades rurais daquele outro patrimônio particular que pertence ao produtor rural para uso apenas familiar. À título de exemplo, podemos listar 6 (seis) vantagens: 1) Primeira, a proteção patrimonial vulgarmente chamada de “blindagem”. Nela, os riscos da atividade empresarial poderão ser segregados e alocados em nome da pessoa jurídica, com menor possibilidade dos bens particulares já conquistados pelos sócios virem a responder por alguma dívida, passivo ou contingência proveniente dessa atividade empresarial; 2) Segunda, o planejamento sucessório, com a utilização da holding como veículo para a transferência em vida dos bens da família. Ela possibilita a formatação de um planejamento sucessório que permite ao produtor realizar a integralização dos bens de uma só vez ou de forma programada por etapas. Da mesma forma, a holding permite que a transferência das ações ou quotas aos filhos possa ser feita também de maneira programada por etapas, devidamente acompanhada com a imposição do direito real de usufruto vitalício em favor do produtor rural e da previsão das cláusulas restritivas de incomunicabilidade, impenhorabilidade, inalienabilidade e reversão em face dos filhos. Nesses casos, fazemos a sucessão patrimonial em vida com o menor impacto econômico financeiro possível, gerando um ganho de eficiência que chamamos de “efeito caixa” que resulta num custo mais factível de ser assumido pela família, tendo em vista que é parcelado e menor quando comparado com os tributos cobrados dentro de um procedimento normal de inventário em que os custos devem ser pagos à vista e em bases de cálculos maiores. 3) Terceira, a eliminação da necessidade da outorga conjugal das pessoas físicas. Com a titularidade dos imóveis na holding, o contrato ou estatuto social poderá prever regras específicas para a celebração de negócios que envolvam o patrimônio da empresa, inclusive para a alienação de bens e imposição de ônus real sobre os imóveis. O artigo 1.647 do Código Civil não será aplicado, em consonância com o art. 978 desse Código. 4) Quarta, obtenção de ganhos de eficiência tributária, com a possibilidade de se enquadrar a pessoa jurídica num regime de tributação menor que a pessoa física e também montar um planejamento tributário entre a relação da holding rural e o produtor rural. De um lado, a holding rural pode vir a ter receita com a locação, parceria ou arrendamento dos seus bens para o produtor rural que continua a explorar a atividade rural, fazendo com que essa renda gerada possa ser distribuída entre os sócios da holding, inclusive entre aqueles familiares que são herdeiros mas não participam diretamente da atividade rural (fato bem comum dentro das famílias devido as diferenças entre os interesses dos filhos). De outro lado, temos o produtor rural que poderá utilizar esses custos da locação, parceria ou arrendamento como despesa da atividade rural que será deduzida das receitas tributáveis auferidas. 5) Quinta, a concentração na administração dos bens da família. As decisões dentro da família poderão ser tomadas de forma colegiada com a participação de todos e por maioria dentro de instâncias formais. Será possível criar estruturas de governança dentro da holding para administração dos bens familiares, com utilização de outras ferramentas jurídicas como o acordo de sócios, protoloco de família, conselho de administração, diretoria e conselho fiscal; e 6) Sexta, a preservação do patrimônio no tempo e entre gerações. Por se tratar de uma pessoa jurídica, será possível se prevenir contra eventos futuros inerentes e próprios das pessoas físicas. Me refiro às hipóteses de falecimento, separação conjugal e incapacidade civil das pessoas físicas que normalmente acarretam efeitos negativos com a partilha de bens e a troca involuntária dos responsáveis pela administração desses bens. Sem dúvidas são eventos que geram impactos negativos sobre o patrimônio. Portanto, essas são algumas das vantagens mais comuns provenientes da holding rural. Mas fique atento porque será sempre necessário analisar também as eventuais desvantagens da holding. Algumas precauções devem ser tomadas na área tributária para eu o produtor rural não perca os benefícios associados à atividade rural. Especialmente a capitalização de máquinas, equipamentos e benfeitorias deve ser precedida de criteriosa análise para checar se esses bens foram deduzidos como despesas de investimentos nos anos anteriores. Se houve essa dedução, o produtor rural deverá revertê-la no ano da capitalização e tratar o valor dos equipamentos como receita da atividade reunião daquele ano, fato que poderá gerar Imposto de Renda a pagar no ano do reconhecimento dessa receita.

QUEM PODE SER INVENTARIANTE NA FAMÍLIA?

Hoje iremos tratar de um tema sucessório que reflete a dúvida de muitas famílias no momento do planejamento e início do inventário. Logo após o falecimento, a família normalmente está fragilizada e sentida com a perda de um parente querido. Mas o Estado não se importa com isso e a letra da lei fria obriga que a família já venha a adotar as medidas iniciais e necessárias para propor o procedimento de inventário (seja extrajudicial ou extrajudicial) dentro do prazo de até 60 (sessenta dias), conforme determina o art. 611 da Lei 13.105 de 2015 (o nosso Código de Processo Civil). E nesse momento a família se pergunta: quem da família poderá ser o inventariante? Como escolher o responsável por esse encargo? Existe uma ordem legal para a nomeação do inventariante dentro da família?

Em primeiro lugar, importante relembrar quais são as funções de um inventariante. A pessoa que for nomeada como inventariante deverá ter a consciência de que irá exercer uma tarefa de utilidade pública, com o desempenho de obrigações e deveres que lhe são impostas por lei durante a administração do Espólio. Nos termos do art. 618 do Código Civil, o inventariante deverá: 1) representar o espólio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele; 2) administrar o espólio, velando-lhe os bens com a mesma diligência que teria se seus fossem; 3) prestar as primeiras e as últimas declarações pessoalmente ou por procurador com poderes especiais; 4) exibir em cartório, a qualquer tempo, para exame das partes, os documentos relativos ao espólio; 5) juntar aos autos certidão do testamento, se houver; 6)  trazer à colação os bens recebidos pelo herdeiro ausente, renunciante ou excluído; 7) prestar contas de sua gestão ao deixar o cargo ou sempre que o juiz lhe determinar; e 8) requerer a declaração de insolvência. Além dessas tarefas que são eminentemente de um administrador de bens de terceiros, o inventariante poderá ir além e exercer outros atos mais gravosos que impliquem na negociação ou alienação dos bens do Espólio. Mas para a realização desses atos específicos em nome do Espólio, o inventariante deverá obrigatoriamente solicitar a autorização prévia do Juiz e também ouvir todos os interessados justamente por afetar diretamente o patrimônio do falecido. Esses atos que requerem alvará judicial estão listados no art. 619 do Código Civil e compreendem os seguintes: 1) alienar bens de qualquer espécie; 2) transigir em juízo ou fora dele; 3) pagar dívidas do espólio; 4) fazer as despesas necessárias para a conservação e o melhoramento dos bens do espólio. Bom, agora que você já sabe quais os atos um inventariante pode ou não fazer, vamos esclarecer o aspecto subjetivo de quem pode ser escolhido dentro da família para exercer esse encargo. O nosso Código Civil determina no art. 617 uma ordem de nomeação que deve ser seguida pelo Juiz para a escolha do inventariante. Essa ordem é extensa e formada pelas seguintes pessoas, a serem nomeadas sucessivamente: 1) primeiro, o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte deste; 2) segundo, o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou se estes não puderem ser nomeados; 3) terceiro, qualquer herdeiro, quando nenhum deles estiver na posse e na administração do espólio; 4) quarto, o herdeiro menor, por seu representante legal; 5) quinto, o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados; 6) sexto, o cessionário do herdeiro ou do legatário; 7) sétimo, o inventariante judicial, se houver; e por último, 8) oitavo, pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial. Ocorre que, na prática, essa ordem de nomeação somente é observada com rigidez pelo Juiz quando existem divergências dentro da família para uma escolha amigável do inventariante, ou então, existam conflitos no desempenho dessa função de alguém já nomeado, que são os casos em que se poderá ter a remoção de um inventariante de ofício ou por requerimento de alguma das partes. Normalmente, se a família vier a escolher o inventariante em consenso, o Juiz tende a aceitar essa nomeação e confirmar a pessoa indicada pela própria família para o desempenho do encargo de inventariante, mesmo que esteja fora da ordem explicitada pela lei. Em regra, o Juiz respeita a indicação feita em consenso pela família justamente por entender que ela terá melhores condições de escolha. Assim também funciona perante o Cartório caso o inventário venha a ser feito de maneira extrajudicial, quando a nomeação é amigável junto ao notário. Por isso, na prática a família deverá observar a ordem legal disposta no Código Civil, mas nada impede que os seus membros venham, em consenso, escolher alguém fora dessa ordem mas que, no caso específico, seja mais adequado e efetivo para a família.

POSSO TRANSFERIR IMÓVEL FINANCIADO PARA A HOLDING?

Hoje iremos tratar do tema “Holding”, especificamente para esclarecer uma dúvida muito comum que surge dentro das famílias quando vamos realizar o início do planejamento sucessório. Nesse início, discutimos com a família quais as ferramentas jurídicas mais adequadas para a proteger o patrimônio da família e quais bens entrariam dentro do planejamento da sucessão em vida dos bens dos patriarcas. Nessa seleção, surgem então as seguintes dúvidas quando optamos por utilizar a holding: os imóveis que estão financiados podem ser transferidos para a holding? Esses bens devem entrar no planejamento sucessório? Quais as vantagens e desvantagens para a família?

No que se refere ao tema de hoje, o primeiro esclarecimento jurídico importante a se fazer é que, em se tratando de imóvel financiado, temos que ter a clareza de que o comprador do imóvel ainda não detém para si a propriedade do bem imóvel. O comprador que adquire um imóvel de maneira financiada transfere, no ato da compra, a propriedade desse bem em favor da instituição financeira como forma de garantia do pagamento do empréstimo bancário feito para a aquisição do bem. Essa modalidade de garantia se chama “alienação fiduciária” e encontra regulamentada por meio da Lei 9.514, de 20 de novembro de 1997. Dessa maneira, enquanto estiver financiado o imóvel pertencerá ao Banco que ficará com a titularidade desse bem de forma temporária como forma de garantir o pagamento do financiamento imobiliário. A instituição detém o que chamamos de “propriedade resolúvel” do imóvel, o que faz com que ele seja dono até o comprador quitar integralmente o seu contrato de financiamento. Por isso, se quisermos transferir o imóvel da pessoa física dos Pais ou dos filhos para dentro da pessoa jurídica da holding da família, será necessário primeiro consultar o banco para assim obtermos a sua autorização sobre essa operação. É possível transferir o imóvel da pessoa física dos Pais para a holding familiar desde que o a instituição financeira venha a concordar com essa troca de titularidade do devedor do financiamento imobiliário. Isso porque o art. 29 da Lei 9.514/97 é claro ao dizer que o fiduciante (que é o comprador/mutuário), poderá transmitir os direitos de que seja titular sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária em garantia, desde tenha a anuência expressa do fiduciário (isto é, o banco). A consequência dessa operação é a de que a holding, na qualidade de nova adquirente do bem imóvel, virá por lei a assumir todas as obrigações dos antigos compradores que são os Pais. Portanto, do ponto de vista jurídico fica esclarecido de que é possível sim transferir o bem imóvel financiado para a holding familiar. Agora, a grande questão que fica para ser analisada pela família é do ponto de vista comercial: será que faz sentido essa operação e se mostra vantajosa dentro do planejamento patrimonial e sucessório da família? Bom, aí sob esse aspecto será necessário analisar cada caso porque o banco irá refazer todo o procedimento de financiamento do imóvel para conceder a aprovação dessa transferência. A instituição financeira irá refazer a análise de crédito, avaliação de renda, históricos de restrições de nome, as taxas mensal ou anual de juros, as parcelas semestrais, os descontos porventura concedidos, enfim, todos os encargos legais ou contratuais. Se for aprovado, a holding familiar deverá assinar um novo contrato financiamento do imóvel com os valores e descontos atualizados. Neste ponto, cabe lembrar que, na maioria das vezes em razão dos incentivos governamentais, os encargos legais e contratuais aqui no Brasil são menores e mais vantajosos para financiamentos imobiliários firmados em nome de pessoa física, em comparação com as taxas bancárias praticadas para a pessoa jurídica. Além disso, a holding familiar deverá pagar em favor da Prefeitura Municipal um novo valor de Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) pela nova transferência onerosa da propriedade sobre o bem imóvel. E por último, o novo contrato financiamento precisará ser levado até o Cartório de Registro de Imóveis da região onde se encontra o imóvel em questão, fato que irá gerar novas despesas com emolumentos a serem pagos em favor do cartório local. Por tudo isso que foi exposto, necessário cautela e uma análise mais criteriosa para se verificar se, no caso da sua família, valerá a pena ou não fazer a transferência do bem imóvel financiado dos Pais a para holding familiar.

FILHO FORA DO CASAMENTO PODE SER EXCLUÍDO DA HOLDING?

Hoje, vamos conversar sobre holding familiar e uma situação cada vez mais comum quando vamos realizar o planejamento sucessório dos Pais. Essa situação diz respeito a seguinte situação: família que são compostas por filhos de diferentes relacionamentos. Então surge a seguinte dúvida: posso e contemplar somente parte dos filhos ao fazer o planejamento sucessório dos meus bens atuais? Os filhos anteriores ao relacionamento atual podem ser excluídos da holding que será constituída pela família atual? Como fica a situação perante a holding já que que são anteriores ao relacionamento e somente de uma das partes?

Para entendermos melhor esse assunto, vamos fazer 2 (dois) esclarecimentos preliminares para que possamos nos despir de qualquer preconceito cultural que eventualmente  carregamos.  O primeiro esclarecimento é sobre o reconhecimento da pessoa como “filho legítimo”. Um filho é filho pleno e legítimo em qualquer circunstância! Não existe qualquer distinção entre os filhos, e tampouco faz qualquer diferença se foram ou não havidos dentro de um relacionamento formal reconhecido pelo Estado como o casamento ou união estável. Todos os filhos têm exatamente os mesmos direitos e deveres e, especificamente no âmbito sucessório, todos têm direito à herança dos seus Pais na qualidade de herdeiros legítimos, nos termos do art. 1.829 do Código Civil. O segundo esclarecimento, que é consequência do primeiro, é todos os filhos tem direito à mesma participação sobre a herança dos Pais. Dentro da categoria de herdeiros necessários conforme dispõe o art. 1.845 do Código Civil, os filhos têm garantido por lei uma participação igualitária e mínima sobre 50% dos bens dos Pais como herança, que é chamada de “parte legítima da herança”. Assim, aquela distinção que ouvimos no passado sobre uma categoria de direitos para os “filhos legítimos” (para aqueles havidos dentro do casamento) e outra categoria para os “filhos ilegítimos” (provenientes de relacionamento fora do casamento) não existe mais dentro do atual contexto legal. Até porque essa categorização era no passado muito atrelada à hipótese de uma “traição” no relacionamento, em que normalmente a figura do homem vinha a ter outros filhos fora do seu casamento de forma concomitante. Entretanto, hoje existem entidades familiares com configurações bem diversas, com situações comuns em que Pais ou Mães solteiros (já com filhos) resolvem se relacionar formalmente com outra pessoa e vêm a ter novos filhos dentro do casamento ou união. Assim como, existem Pais ou Mães divorciados ou viúvos (já com filhos de um relacionamento formal anterior) que resolvem contrair novo relacionamento e ter outros filhos dentro dessa nova relação. Portanto, digo isso tudo para te mostrar que não importa quando foram tidos (jovem, meia idade ou mais velha), qual era o seu momento de vida (como solteira ou após relacionamento) e nem sob quais circunstâncias formais (dentro ou fora de qualquer casamento ou união formal), todos os filhos são iguais. Sendo assim, ao realizar o planejamento sucessório dos seus bens fique atento! Não é possível excluir quaisquer dos filhos da sua parte na herança, sob pena de nulidade do planejamento sucessório nos termos dos arts. 549, 1.846, 1.857, parágrafo 1º e 2.018 do Cósigio Civil. Ao responder a anamnese do planejamento para o levantamento de informações sobre a família, você deve sim dar conhecimento ao seu advogado sobre todos os filhos que possui (dentro ou fora do atual relacionamento), a fim de que o profissional possa levar isso em consideração na hora de escolher as ferramentas jurídicas mais adequadas, incluindo a holding. Vou além, você deverá informar inclusive não só os filhos já “reconhecidos” perante a lei, mas também aqueles que eventualmente ainda não estão “reconhecidos” mas já são “conhecidos” como filhos, pendente apenas a formalização em cartório ou, até mesmo, um teste de DNA ou ação de paternidade para tirar qualquer dúvida. Com esse diagnóstico completo e sincero, caso venha a optar pelo planejamento sucessório com a utilização da holding familiar, você deverá analisar se será melhor no seu caso fazer uma só holding para toda a família com todos os filhos, ou então mais de uma holding para que cada filho receba o seu quinhão hereditário separadamente e evite conflitos futuros. Portanto, será proibido excluir quaisquer dos filhos da sucessão e seu direito à parte legítima e, caso exista outro relacionamento em andamento, lembre-se de respeitar a meação dos bens comuns conforme o regime patrimonial vigente para a relação.