Governança Jurídica por Matheus Bonaccorsi – Meu filho menor pode ser sócio da empresa? Será?

Meu filho menor de idade pode ser sócio da nossa empresa? Pode receber as cotas ou ações da empresa da família? Além das cotas ou ações, é possível fazer o planejamento patrimonial e transferir outros bens para o filho menor?

Mesmo que as vezes a conversa seja difícil, você tenha o Pai resistente, a sua Mãe se omite sobre esses assuntos, talvez um dos irmãos seja mais problemático, não se possa falar abertamente sobre dinheiro dentro da sua casa, enfim, tente! Uma boa conversa e uma informação correta, esclarecedora, são tudo que você precisa!

Bom, o primeiro esclarecimento que gostaria de te passar é o seguinte: temos 2 (dois) tipos de menores de idade aqui no Brasil. O menor totalmente incapaz que é a pessoa com até 16 anos, e o menor relativamente incapaz que são as pessoas de 16 anos até 18 anos, quando então o menor atinge a maioridade e pode assim praticar todos os atos da sua vida sem a interferência dos Pais.

Para o mundo jurídico, essas pessoas são consideradas de forma presumida como incapazes porque, em alguma medida, ainda possuem o um total discernimento, uma noção clara e nem uma dimensão plena das questões patrimoniais e financeiras que são oriundas dos relacionamentos em sociedade. Essas pessoas não tem total entendimento sobre o alcance dos direitos e obrigações que existem nas relações civis entre pessoas, dentro de uma convivência em sociedade. Por isso, precisam de uma proteção especial e auxílio dos Pais, e em alguns casos, até mesmo do Ministério Público e da Justiça para praticarem atos em seu nome. Cada situação deve ser analisada com cuidado, caso a caso!

Mas como o foco deste vídeo é sobre o recebimento de bens, vou me ater aos seguintes pontos: – Meu filho menor de idade pode ser sócio da nossa empresa? Pode receber as cotas ou ações da empresa da família? Além das cotas ou ações, é possível fazer o planejamento patrimonial e transferir outros bens para o filho menor?

Vamos à primeira dúvida: – meu filho menor de idade pode ser sócio da nossa empresa? Sim! A nossa legislação permite que um menor de idade seja sócio de uma empresa. Não importa o tipo societário dessa empresa, o nosso Código Civil permite que o menor venha a se tornar sócio de uma empresa Limitada, uma Sociedade Anônima, ou ainda qualquer outro tipo de sociedade que desenvolva atividades simples ou empresariais.

Entretanto, atenção!! É preciso observar 3 regrinhas básicas que a nossa lei exige para que o menor venha a se tornar sócio de uma empresa!

Primeiro, o sócio incapaz não pode exercer a administração da sociedade, devendo obrigatoriamente ser nomeada outra pessoa para gerir os negócios, que poderá ser um outro sócio (neste caso, teremos a figura do Sócio-Administrador) ou até mesmo um terceiro que não seja sócio (teremos assim a figura do Administrador Não-Sócio). Em ambos os casos, esse administrador poderá ser nomeado no próprio Contrato ou Estatuto Social, ou então, de forma separada por meio de uma Ata de Reunião ou Assembléia de Sócios, devendo tais documentos serem devidamente registrados na Junta Comercial ou Cartório, a depender do caso.

Mas o importante: o menor não pode ser o administrador!

Segunda regra: o capital social da sociedade deve ser totalmente integralizado. O que é isso? O dinheiro que os sócios se comprometeram a colocar na empresa para iniciar a sociedade e forma o capital social (“capital da sociedade”, seja ele qualquer valor – um mil, dois mil, cem mil) já deve ter sido aportado por todos os sócios. Eles já devem ter pago integralmente à sociedade pela subscrição e aquisição daquelas cotas ou ações. Isso quer dizer que o menor pode sim receber as cotas e ações da empresa, mas essas cotas ou ações devem estar sem dívidas, sem obrigações, sem o compromisso ainda pendente de aportar dinheiro para dentro da empresa. Do contrário, seria como se você, atual sócio, tivesse transferindo essa sua obrigação para o menor. Entende?

E a terceira e última regra é a seguinte: o menor absolutamente incapaz (recapitulando, é aquele até 16 anos) deve ser assistido pelos seus Pais ou o menor relativamente incapaz (aquele entre 16 até 18 anos) deve ser representado pelos seus Pais. A lei é clara ao exigir que os Pais, na qualidade de representantes legais dos filhos, venham a representar ou assistir o menor de idade na realização desse ato. É necessário que os Pais assinem os documentos em nome do menor ou conjuntamente com o menor para que tal ato seja considerado válido.

Dessa maneira, os Pais devem intervir no ato de recebimento das cotas ou ações como representantes do menor (se ele tiver menos de 16 anos) ou então como assistentes do menor (se ele tiver mais que 16 e menos que 18 anos). É claro que estamos nesse exemplo trabalhando com a figura dos Pais que são os representantes naturais dos filhos conforme a legislação, mas isso vale também para os demais casos em que os Pais eventualmente tenham falecido ou então perdido o pátrio poder e tutela dos filhos. Caso por qualquer motivo exista outra pessoa nomeada pela Justiça como representante legal do menor, é justamente essa pessoa na qualidade de tutora que irá fazer as vezes dos Pais e intervir nos atos a favor do menor.

Agora, aqui vai uma informação muito importante! Uma coisa que gostaria de deixar bem claro e que já foi objeto inclusive de discussão judicial entre os próprios Pais, sejam eles mulher e homem solteiros ou divorciados, marido e esposa casados, companheiro e companheiro em união estável, enfim não importa o vínculo do relacionamento entre Pais e não importa o regime de casamento: a representação ou assistência do menor deve ser feita sempre por ambos os Pais! Preste atenção: ambos os Pais!

Toda a nossa legislação é clara, desde a Constituição da República, passando pelo Código Civil e Estatuto da Criança e do Adolescente até chegarmos nos nossos Tribunais qe já decidiu sobre briga entre os Pais: a regra é clara no sentido de que ambos os Pais devem não só estar cientes do negócio praticado em nome do menor, como também, representa-los ou assisti-los nos próprios atos independentemente do estado civil do relacionamento dos Pais! Caso apenas o Pai ou a Mãe pratique o ato sem a concordância expressa e por escrito do outro, isso é um ato que é considerado nulo, tornando tudo que foi feito somente por um dos Pais como inválido! Isso poderá ser facilmente declarado como nulo pela Justiça!

Diante disso tudo, tome cuidado! É preciso ficar atento ao envolver um menor no planejamento patrimonial da família. É possível, mas existem regras! No caso das cotas ou ações, são as 3 regras que te disse anteriormente: 1) não pode ser administrador; 2) capital integralizado; e 3) presença de ambos os Pais na pratica do ato.

Sobre os demais bens que eventualmente o menor venha também a receber, por exemplo carros, imóveis, dinheiro, etc., o menor também poderá receber tais bens desde que siga a terceira regra que explicamos antes: ou seja, esteja devidamente representado ou assistido pelos seus Pais.

Governança Jurídica por Matheus Bonaccorsi – Holdings familiares

Muitos tem dificuldade de pensar a longo prazo, mas essa espécie de visão é fundamental para que você alcance a meta! E um dos setores do planejamento são as holdings familiares, as quais vamos falar hoje com enfoque nas famílias empresárias.

’O que seria uma holding?’’

A tradução livre de ‘’holding’ ’para o português, a título de curiosidade, significa controlar, segurar, manter ou guardar.

É uma empresa (pessoa jurídica) criada a parte para deter bens e direitos de uma ou mais pessoas físicas.

Um erro bem comum é achar que a ‘’sociedade holding’’ é um tipo societário. Do ponto de vista jurídico há uma distinção entre esses termos, qualificar uma sociedade como holding serve para retratar o propósito especifico de suas atividades econômicas definidas pelos sócios ou sócio, no Contrato Social ou Estatuto Social. Sendo assim, essa empresa denominada de ‘’holding’’ foi constituída necessariamente sob aquele formato societário com personalidade jurídica, tendo seu ‘’diferencial’’ o fato de seu objetivo social ser voltado para o controle, manutenção e detenção de bens e direitos patrimoniais.

Enfim, existem vários ‘’tipos de holding’’, como imobiliária, rural, etc., as quais voltarei em próximos vídeos para falar sobre, hoje vamos falar das familiares.

O que seria uma holding familiar?

A Holding familiar, seria uma ‘’empresa’’ para deter o controle patrimonial de uma ou mais pessoas físicas da mesma família com bens e participações societárias em seus nomes. Ou seja, esse patrimônio será administrado e protegido por uma sociedade compostas por membros da mesma família. Essa esfera do planejamento jurídico vai blindar seu patrimônio e pode evitar futuros conflitos que podem evoluir ate a brigas judiciais, por já ter tudo previamente ‘’esquematizado’’, dentre os demais benefícios que vou te contar agora.

Importância / Vantagens de ter uma holding:

Como eu havia dito, é muito importante pensar a longo prazo e prever riscos e conflitos, para caso venham a ocorrer, solucioná-los de forma rápida e eficaz para que seu negócio não perca a performance.

A Holding, embora seja uma ‘’empresa’’ (pessoa jurídica) usufrui de grande mobilidade, pode se estabelecer em qualquer lugar a qualquer tempo, uma vez que quase a totalidade de seus ativos (ações, títulos, posse, demonstrações e controle) cabem por exemplo, em um notebook.

Outro ponto positivo é que ela promove um carácter de internacionalidade, isto é, pode manter ações de companhias mesmo que não estejam necessariamente no mesmo país, se mostra como uma importante ‘’ponte’’ para empresas controladoras de exportação, importação e investimentos estrangeiros.

Uma das importantes finalidades que ela pode ter é manter majoritariamente ações de outras empresas, possibilitando assim o controle de grupos empresariais de forma concentrada evitando a pulverização das ações decorrente de sucessivas alienações. Exercendo o poder de controle sem necessariamente a totalidade das cotas ou ações, mas em qualidade suficiente a fim de influir diretamente nas decisões.

Dentre esses, constituir uma holding familiar tem outros 3 benefícios os quais julgo mais importantes, se estruturados de forma correta.

Benefício número um: BLINDAGEM PATRIMONIAL

No início do vídeo comentei sobre ele rapidamente, mas é o seguinte: essa é uma forma de ‘’defender’’ seu patrimônio. Riscos que sua empresa está sujeita, podem afetar seus bens, mas com esse mecanismo que estamos tratando, esses bens estarão sob controle da holding, que, digamos, estará hierarquicamente superior para geri-los.

Benefício Numero dois: Facilidade na Sucessão Patrimonial

A Holding facilita o ‘’processo’’ de sucessão de bens, mas para isso as regras de sucessão patrimonial devem estar claramente estabelecidas no contrato social dela.

Aqui nesse tipo de holding, além dos genitores poderem confiar o patrimônio pessoal na sociedade, as quotas ou ações podem ser doadas em favor dos sucessores com reserva de usofruto, o que vai afastar a necessidade do inventário.

Também, é possível acrescentar no ato constitutivo, clausulas essenciais que podem determinar a inalienabilidade, incomunicabilidade, impenhorabilidade sucessão em caos de falecimento, distribuição das quotas sociais, exclusão de sócios e ingresso de terceiros.

Desse modo, reduz muito a chance de conflitos futuros, já que os pontos os quais são a maior concentração de brigas judiciais entre famílias empresárias e seus devidos sucessores, estão planejados e previstos.

Benefício número três: Vantagens Tributárias

No nosso país, uma das maiores dificuldades e medo de toda empresa é o que tange à tributação, que é consideravelmente alta aqui. Assim, com um bom planejamento tributário é possível amenizar essa situação, e uma dessas formas é incluindo os membros da família, na holding.

Os lucros de rendimento líquido da holding, são distribuídos entre os sócios a partir do percentual de quotas, estas que estão definidas no contrato social. A holding familiar tem carga tributária reduzida! O que torna o lucro ainda maior.

Como exemplo, são os rendimentos provenientes de aluguel. Na pessoa física, esses rendimentos são tributados a uma alíquota de 27,5% e na holding aproximadamente 12%.

Enfim, esses diversos benefícios que eu mencionei restringem a interferência no capital social da holding das obrigações e responsabilidade por dívidas pessoais dos sócios também, a não ser nos casos previstos em lei, mas que não seja uma prática condizente com as normais legais. Então é uma excelente dica de como proteger seu patrimônio e exercer a governança jurídica em prol ao crescimento da sua gestão e longevidade da sua família empresária.

Governança Jurídica – Respondendo dúvidas o vídeo – Como proteger os bens do meu filho “especial”

Hoje iremos abordar uma situação familiar delicada, muito importante para a manutenção da união familiar, e, que merece atenção de todos os envolvidos dentro de uma família, a proteção dos bens de um filho “especial”.

Trata-se do seguinte ponto: como proteger o meu irmão, neto ou filho “especial”? Existe alguma possibilidade de proteger o patrimônio dessa pessoa especial, que do ponto de vista jurídico é considerada como “incapaz”? Tem algo que possa ser feito para preservar o patrimônio e a sustentabilidade dessa pessoa no tempo? E quando os seus Pais ou responsáveis falecerem, como ficará a situação patrimonial desse filho, irmão ou neto especial?

O tema de hoje foi inspirado num planejamento patrimonial e familiar que desenvolvemos para uma família que é composta pelos Pais, o Pai e a mãe ainda vivos mas já idosos em idade mais avançada, e 2 (dois) filhos vivos maiores (ambos tinham acima de 18 anos), sendo que um deles é especial, tem síndrome de down e não tem pleno discernimento das questões civis, patrimoniais e financeiras, apesar de ser um menino muito inteligente, esperto e ativo. A preocupação dos Pais, claro, era elaborar uma estrutura que garantisse a sobrevivência do filho incapaz ao longo do tempo, especialmente após o falecimento deles, Pais, que são os atuais responsáveis pelo filho.

Bom, primeiramente importante esclarecer que o caso hoje se refere a uma pessoa que tinha especificamente a síndrome de down mas serve também para qualquer outro tipo de síndrome, deficiência, doença, ou ainda, qualquer outro motivo de limitação que leve à perda da capacidade civil de uma pessoa. Essa limitação pode ter sido adquirida infelizmente desde o nascimento, ou posteriormente como por exemplo no caso de um acidente ou doença que tenha, também infelizmente, acometido algum membro da nossa família em algum estágio da sua vida.

Mas o que seria essa incapacidade civil já no nascimento ou perda da capacidade civil no futuro? Para o mundo jurídico, as situações de incapacidade seriam aqueles casos em que, por algum motivo, a pessoa perda, em alguma medida, o total entendimento sobre o alcance dos direitos e obrigações que existem nas relações civis, entre pessoas, dentro de uma convivência em sociedade. A pessoa não possui um total discernimento, uma noção clara e nem uma dimensão plena das questões patrimoniais e financeiras que são oriundas dos relacionamentos internos e externos com terceiros.

Por isso, dizemos que essa pessoa é incapaz do ponto de vista civil, e necessita de um cuidado especial de alguém com plena capacidade civil para melhor cuidar e proteger os seus interesses não da saúde, mas também os seus interesses patrimoniais e financeiros.

Voltando ao caso da família que relatei, inicialmente tínhamos o seguintes problemas: Primeiro problema: Se os Pais nada fizessem, o filho incapaz receberia futuramente a sua parte na herança em caso de falecimento dos Pais, vindo a ser necessária a intervenção da Justiça e do Ministério Público para opinar e definir essa situação; Segundo problema: Se os Pais utilizassem os instrumentos do Testamento, em conjunto ou não, com o instrumento da doação em vida de bens para fazer já realizar o planejamento sucessório, ainda assim o filho incapaz viria a receber parte do patrimônio da família como herança advinda da parte legítima, mesmo que se buscasse diminuir ao máximo essa parte com a doação da parte disponível para o outro irmão administrar. Neste caso, também teríamos a necessidade da intervenção da Justiça e do Ministério Público para opinar e interferir nessa situação porque o filho incapaz continuaria a receber e nome próprio (ou seja, viria a ser titular e proprietário) de parte dos bens móveis e imóveis da família.

Então qual foi a saída que encontramos para esse caso? A nossa ideia foi a de fazer o planejamento sucessório utilizando um instrumento específico: qual seja, a constituição de uma holding patrimonial familiar para administrar os bens próprios da família. Mas não foi uma holding comum, normal. Essa nova empresa familiar precisou ter algumas características específicas, dentre elas uma principal: criamos 2 tipos de ações para diferenciar os direitos de cada sócio: ações ordinárias e ações preferenciais.

As ações ordinárias, foram recebidas pelo filho capaz que tinha o direito de voto e definição sobre a gestão da sociedade patrimonial da família. Já as ações preferenciais, foram destinadas ao filho especial, incapaz, que não tinha direito de voto (justamente em razão da sua limitação), mas tinha o direito especial de receber uma distribuição de lucro fixa e dentro de um valor mensal compatível com as suas despesas pessoais, garantindo assim o seu sustento vitalício com tranquilidade e segurança.

No caso dessa família, optamos por utilizar o tipo de sociedade, em empresa, que denominados de “sociedades anônimas fechadas” para proteger o patrimônio da família. Isso porque o volume de patrimônio da família era considerável (tinham vários bens imóveis) e por outras circunstâncias (o Pai era empresário), entendemos que esse tipo de empresa que é a “sociedade anônima” viria a proteger melhor e de forma mais adequada a família.

Mas gostaria de ressaltar que, mesmo que a família tivesse pouco patrimônio ou não tivesse recursos financeiros para manter uma empresa, existe uma opção mais barata que é utilização de uma empresa limitada. É possível utilizar a chamada “sociedade limitada” – LTDA (que é o tipo de sociedade mais comum aqui no Brasil) para também realizar esse planejamento sucessório e conseguir ter 2 (dois) tipos de cotas diferentes entre os sócios: as  cotas ordinárias e as cotas preferenciais.

Inclusive, eu já gravei um vídeo a respeito cujo link vou deixar na descrição. Assiste aqui no Canal que você via achar as explicações jurídicas sobre a possibilidade de constituir uma empresa limitada que tenha essas características e diferenciação entre os sócios. Atualmente a questão está pacificada e desde 2017 os órgãos públicos admitem com clareza a utilização das empresas limitadas com 2 (dois) tipos de cotas diferentes.

Assim, resolvemos o caso da família da seguinte forma:

  • Passamos todo o patrimônio de bens imóveis dos Pais para o nome da empresa familiar, que tem por finalidade exercer as atividades de uma holding patrimonial;
  • Nessa transferência, economizamos o custo do ITBI municipal (tributo cobrado pelas Prefeituras) porque fizemos essa transferência por meio da realização de capital social;
  • Os Pais fizeram a doação das cotas aos filhos, com a reserva de usufruto e outras cláusulas restritivas a fim de garantir que eles, Pais, estivessem na administração da empresa de forma vitalícia. Ou seja, enquanto estivessem vivos poderiam usar e receber os alugueis e demais bens da empresa;
  • Conseguimos reduzir o custo do ITCMD estadual, que é o imposto sobre a doação na medida em que os valores das cotas ficaram menor porque os bens foram integralizados pelos valores históricos declarados nos Impostos de Renda dos Pais;
  • Todo o patrimônio da família foi e será preservado após o falecimento futuro dos Pais, sem necessidade de intervenção da Justiça ou Ministério Público;
  • O irmão capaz recebeu as cotas ordinárias com direito a voto e definição sobre a administração da empresa;
  • O irmão especial, incapaz, recebeu as cotas preferenciais com direito a um dividendo fixo mensal e garantia de recebimento de dinheiro suficiente para o seu sustento vitalício com tranquilidade e segurança, mesmo após o futuro falecimento dos Pais.

Bom, assim foi feito de maneira a resolver essa situação dentro da família e conferir proteção legal, patrimonial e financeira ao filho especial.

Governança Jurídica por Matheus Bonaccorsi – Como vender um bem de pai para filho. Cuidado!

É possível um Pai ou uma Mãe vender um bem móvel ou imóvel para um filho? É possível realizar essa venda com segurança? E se a família tiver outros filhos e a venda for feita para apenas um dos filhos? Os Pais podem realizar essa venda somente para um dos filhos, independentemente da vontade dos demais filhos? Ou todos os demais filhos devem concordar com a venda e as condições do negócio?

Eu sempre digo: busque informações e procure se inteirar as regras e condições dispostas na legislação antes de tomar qualquer decisão que envolva, de um lado patrimônio, bens dinheiro, e do outro lado a relação entre familiares, Pais, irmãos, enfim, pessoas com algum vínculo de parentesco.

Aqui no Brasil, pela nossa cultura, é muito difícil mesmo falarmos abertamente de dinheiro e bens, ainda mais dentro de uma família. Nem sempre é fácil sentar em volta de uma mesa para discutirmos, em conjunto, a melhor forma de administração e destinação desses bens. E justamente devido a essa falta de conversa, clareza e transparência, surgem desentendimentos entre os familiares e as diferenças, muitas vezes não compreendidas por todos, vêm a tona com o passar do tempo sob a forma de brigas, discussões e, até mesmo, processos judiciais entre os próprios familiares! Isso mesmo! Litígios e processos patrimoniais por falta de uma boa conversa e conciliação!

Primeiramente, importante você saber que sim! A legislação brasileira permite que um Pai, uma Mãe, faça a venda de um bem móvel ou imóvel para um filho. Inclusive, essa venda poder ser realizada para um só filho, caso a família seja composta também por outros filhos. O nosso Código Civil é claro nesse ponto mas, porém, exige que esse tipo de negócio seja feito com algumas regras e condições específicas para que seja considerado válido! E é justamente aqui que você deve ficar atento e não dar bobeira na hora de fazer uma venda desse tipo!

Para facilitar o entendimento, quero dividir e classificar as regras em 2 (dois) tipos: primeiro, regras ou cuidados básicos, que são os necessários, imprescindíveis de serem observados; e segundo, as regras ou cuidados complementares, que são os adicionais, que devem ser observados em situações específicas.

Primeiro, vamos aos cuidados básicos! São 2 (duas) regras básicas! O primeiro cuidado que deve ser observado é o chamado “consentimento”. Para se fazer esse tipo de venda é necessário pegar a anuência expressa dos demais irmãos do Comprador caso a família seja formada por mais de um filho. Os irmãos do Comprador devem manifestar a concordância com a realização da venda que será realizada pelos Pais.

Além disso, é necessário pegar também a anuência do próprio cônjuge do Pai ou da Mãe que deseja fazer a venda para o filho. Ou seja, é necessário consultar e pegar a concordância expressa também da sua esposa ou marido, se vocês forem casados, ou do seu eventual companheiro ou companheira, se vocês tiverem uma união estável.

Assim, é imprescindível nesse tipo de venda que, além da concordância dos demais filhos que são os irmãos do filho Comprador, o Vendedor (que é o Pai ou a Mãe) pegue também e conjuntamente a anuência do seu cônjuge.

Essa anuência somente não será necessária quando o regime patrimonial escolhido entre os Pais for o chamado “regime obrigatório de separação de bens”. Esse regime é aquele que a lei impõe e obriga que os cônjuges observem quando temos algumas situações específicas dentre as quais são 2 (duas) mais comuns e corriqueiras: quando uma das partes é maior de 70 anos, e, quando uma das partes é menor de idade e precisa de autorização dos Pais para casar.

Mas veja! Isso é importante: não estou falando aqui do “regime voluntário de separação de bens” que é muito comum de ser adotado entre pessoas empresárias para resguardar os interesses do casal. Nesse caso de “regime voluntário de separação de bens”, o consentimento do cônjuge ou companheiro por escrito continua a ser imprescindível para que a venda seja considerada válida!

Por isso, cabe ressaltar que a exceção da lei existe somente quando o regime de bens é o de “separação obrigatória de bens”. Aí sim, nos casos em que o regime de separação é “obrigatório” para os cônjuges, é que não será necessário o consentimento do outro cônjuge para se realizar a venda do bem ao filho porque justamente esse outro cônjuge ou companheiro não detém qualquer interesse sobre o bem vendido, já que não é considerado pela lei como sendo meeiro (em caso de divórcio) ou herdeiro (em caso de falecimento) em relação ao outro cônjuge e seu respectivo patrimônio.

Bom, sobre a segunda regra básica, gostaria de lembrar o seguinte: para que a venda de Pai para filho seja anulada, é necessário que os demais filhos e/ou o próprio cônjuge que não deram o consentimento necessário para a realização do negócio venham a requerer a anulação dessa venda na Justiça dentro do prazo de 2 anos a contar da conclusão do ato. Para que seja anulada, é preciso que dentro do prazo de 2 anos venha a existir uma provocação formal por meio de um processo judicial proposto pelas pessoas prejudicadas para anulação na Justiça da venda realizada pelo Pai ou pela Mãe sem o consentimento dos demais filhos ou do próprio cônjuge. Do contrário, essa venda continua sendo válida mesmo se tiver sido realizada com certos vícios e sem a observância de todos os requisitos da lei e, com o passar dos 2 anos e na ausência de reclamação por qualquer membro da família, acaba por ser tornar consolidada em definitivo sem a possibilidade mais de anulação futura. Essas são as regras básicas!

Agora, eu gostaria de lhe passar 2 cuidados adicionais para realização desse tipo de operação. Primeiro: se o valor da compra e venda for feita pelo valor mínimo descrito no Imposto de Renda do Pai ou da Mãe, ou mesmo se for realizada por um valor inferior ao que o bem vale no mercado atualmente. Exemplo: o bem vale hoje R$300mil, esse é o seu valor de venda no mercado. Mas na época esse bem foi adquirido por R$100mil e será agora vendido por esse R$100mil, seja porque esse é o valor que ainda se encontra declarado no IR dos Pais, ou seja porque os Pais decidiram por qualquer motivo que esse seria o valor justo para a venda do bem ao filho.

Cuidado! Pode existir uma cobrança de ITCMD ou IR nessa operação.

Outra situação: os Pais querem fazer a doação do bem ao filho mas, após analisar os custos envolvidos na doação preferem dissimular esse ato de doação e fazer, do ponto de vista formal, uma operação de compra e venda disfarçada.

Cuidado! Pode existir uma cobrança de ITCMD ou IR nessa operação.

Nas duas situações relatadas, existem 2 (dois) riscos tributários da seguinte ordem que podem estourar no futuro e serem cobrados com multas pesadas, juros e correção pelo Fisco.

Primeiro, o Fisco Estadual pode vir a cobrar o ITCMD por considerar que nessa compra e venda realizada no valor do IR dos Pais ou em valor muito inferior ao de mercado as Partes quiseram, na verdade, burlar o Fisco e deixar de pagar o imposto sobre uma doação. Ou seja, a compra e venda foi feita totalmente fora das condições razoáveis de preço de mercado justamente para simular uma compra e venda com intuito de ocultar uma doação e o pagamento do imposto. Inclusive, em alguns casos não existe fluxo financeiro de pagamento entre as Partes, não existe transferência bancária de dinheiro entre os Pais e o filho que possa ser demonstrada como uma verdadeira compra e venda. As Partes apenas ajustam os lançamentos de débito e crédito nas declarações de imposto de renda mas não realizam de fato essa operação com a transferência real de dinheiro e recursos patrimoniais.

Segundo, a Receita Federal pode entender que, devido a relação de parentesco, a compra e venda realizada pelos Pais ao filho no valor declarado no IR ou em valor inferior ao de mercado foi, na verdade, realizada com a intenção de burlar o ganho de capital que teria existido nessa operação. Os Pais, na qualidade de Vendedores, ao manipular para baixo o preço do bem deixaram de reconhecer o ganho de capital nessa operação e com isso sonegaram o pagamento de 15% a 22,5% sobre o ganho dessa venda comparado com o valor de mercado do bem.

Governança Jurídica por Matheus Bonaccorsi – Herança: Devo pagar aluguel aos meus irmãos?

Hoje iremos esclarecer alguns aspectos relevantes sobre uma questão muito delicada, constrangedora e que está relacionada com o planejamento patrimonial da família, especialmente no momento da sucessão, pagar aluguel para os irmãos.

E a situação muito comum entre as famílias é a seguinte: o meu Pai ou uma Mãe faleceu mas apenas um dos meus irmãos que mora ou utiliza um bem que é de toda a família. O que se deve fazer nessa situação? O que é justo? Esse meu irmão que reside, usufrue ou explora um imóvel de toda a família deve pagar algo? Um valor de aluguel, fruição ou algo parecido?

Sim, é a hora dos próprios filhos sentar para conversar sobre a situação patrimonial dos Pais, os custos de um inventário; a melhor forma de se fazer esse inventário (seja de forma extrajudicial ou judicial); a existência ou não de um testamento deixado pelo falecido; qual será a proposta de partilha e divisão dos bens justa e consensada entre os herdeiros; enquanto isso, quem irá arcar despesas para manutenção desses bens até a efetiva divisão; será que existem dívidas em nome do falecido a serem pagas e abatidas na herança; e muitas outras questões que infelizmente se colocam para serem resolvidas num momento de maior sensibilidade e fragilidade dentro da família!

E, nessa situação, justamente quando é chegada a hora da sucessão patrimonial, os irmãos se perguntam:

– O meu Pai ou uma Mãe faleceu, mas apenas um dos meus irmãos que mora ou utiliza um bem que é de toda a família. O que se deve fazer nessa situação? O que é justo? Esse meu irmão que reside, usufrui ou explora um imóvel de toda a família deve pagar algo? Um valor de aluguel, fruição ou algo parecido?

É preciso relembrar o que o Código Civil diz a respeito da coisa comum. Tá lá no artigo 1.326 que diz o seguinte: “Os frutos da coisa comum, não havendo em contrário estipulação ou disposição de última vontade, serão partilhados na proporção dos quinhões”.

Bom, de acordo com tal artigo, o coproprietário de um imóvel tem o direito de receber os frutos do bem que ele é proprietário. Tá certo que no caso de sucessão quem é o “proprietário do bem” até a partilha é o próprio Espólio, mas o herdeiro tem direitos e expectativas sobre esse Espólio (que é justamente o conjunto de bens e direitos do falecido). E por isso, para facilitar o nosso entendimento, podemos dizer o herdeiro, mesmo que indiretamente, no caso por meio do Espólio, tem interesse na percepção, no recebimento dos frutos e rendimentos sobre todos os bens deixados pelo falecido.

Isso quer dizer que ele, na qualidade de herdeiro e futuro proprietário do bem, tem o direito por meio do Espólio de cobrar e receber os frutos e rendimentos sobre todos os bens deixados pelo falecido.

Na prática, isso significa que um irmão pode cobrar do outro um valor de aluguel, de fruição, pelo uso, caso um ou mais irmãos utilizem algum bem do falecido de forma exclusiva. Esse dever de pagar pela utilização do bem permanece até a efetiva partilha dos bens entre os herdeiros e finalização do procedimento de inventário que, como dito, poderá ser feito pela via judicial, ou então de forma extrajudicial desde que os herdeiros sejam todos capazes, não existem divergências quanto a partilha de bens e não seja necessário a venda de algum bem antes da partilha, o que normalmente ocorre quando os próprios herdeiros não tem como pagar os custos do inventário e com isso se faz necessário a solicitação de um Alvará Judicial para vender algum patrimônio ou levantar algum dinheiro em conta para arcar com as despesas do próprio inventário.

Sendo assim, se o bem for de todos, mas apenas um ou uma parte dos irmãos, usufruem de forma exclusiva do bem antes da partilha, este irmão deverá pagar pela utilização de parte do imóvel já que não é totalmente proprietário do bem!

De forma direta e clara: o irmão que usufrui de um bem que é de toda a família deve pagar uma quantia correspondente ao valor de aluguel do bem (móvel ou imóvel) que pertence a todos os herdeiros, sob pena de incorrer no que chamamos de “enriquecimento ilícito” ou “locupletamento sem causa”.

Inclusive, em recente decisão o Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou em definitivo uma Sentença que determinou que herdeiros residentes em um imóvel da família ainda não partilhado pagassem aluguel à uma única irmã que não utilizava o bem.

No caso analisado, a família era composta de três irmãos que eram herdeiros de um imóvel, que fazia parte da herança deixada pelos Pais sendo que o inventário ainda estava em tramitação. Dois dos três irmãos faziam o uso desse imóvel para habitação, como moradia, e a outra irmã, também herdeira, ficava de fora do imóvel (tinha sua própria casa e por isso não utilizava o bem).

E sua defesa, os dois irmãos admitiram que utilizavam o imóvel mas que o inventário ainda estava em curso e que eles próprios arcavam com o pagamento do IPTU e manutenção do imóvel sem a ajuda da outra irmã.  E que, com isso, não teriam a obrigação de pagar aluguel para a irmã.

O que o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu? Não, não! Aqueles que ocupam e se utilizam exclusivamente imóvel deixado em herança ainda não partilhada devem sim pagar aluguel pelo uso aos demais herdeiros. A falta de finalização do processo de inventário não inibe ao herdeiro prejudicado, no caso a irmã, de ter o direito de receber uma compensação financeira dos demais irmãos pela fruição do imóvel.

Os herdeiros são considerados condôminos do bem, e como tal possuem direitos e obrigações, dentro eles inclusive o de receber os frutos (renda) sobre esses bens. Até o momento futuro da partilha, os bens da herança são considerados um “todo unitário” que pertence a todos os herdeiros e, por isso, não podem existir privilégios ou favorecimentos entre os herdeiros.

Mas aí você deve estar se perguntando: mas nesse caso os dois irmãos arcavam sozinhos com as despesas de IPTU e manutenção do imóvel. É justo?

Olha, temos que separar as relações e obrigações de cada parte. Os irmãos tem o dever de pagar pela fruição e utilização exclusiva do imóvel: essa é a obrigação eles. Mas da mesma forma, a outra irmã tem o dever de contribuir com a sua parte sobre a manutenção dos bens que pertencem ao Espólio, ainda que ela não usufrua desse bem. São duas obrigações diferentes, sendo que uma não anula a outra. Mas em termos de valores financeiros, pode sim haver uma compensação em dinheiro entre as obrigações devidas por cada parte para que seja feito um acerto de contas entre eles e assim mensalmente até que seja efetivada a partilha e finalização do inventário.

Governança Jurídica por Matheus Bonaccorsi – 3 motivos para a integralização de bens e imóveis

Hoje iremos esclarecer alguns aspectos relevantes sobre o seguinte tema: integralização de imóveis em empresas. Você já deve ter ouvido falar a respeito desse tema ou escutado as seguintes expressões dentro do mundo empresarial:

– Vou fazer a realização de capital da empresa com o meu imóvel! Ou então, vou utilizar o meu imóvel para fazer a integralização de capital da minha empresa! Ou ainda, simplesmente, vou transferir o meu imóvel que está na minha pessoa física para a empresa!

Enfim, são muitas formas de se tratar ou se referir ao mesmo tema! Essa dicotomia é muito comum no meio jurídico e o meu compromisso aqui com você é: primeiro, explicar de maneira bem simples e objetiva o que isso significa; e, segundo, como isso pode impactar aí na sua vida.

O que significa isso? Pra que serve a transferência de bens em favor da empresa? Quais as vantagens de se realizar esse procedimento? E os custos dessa transmissão do imóvel? Calma que eu vou explicar tudo e não precisa se preocupar com o juridiquês!

A integralização de capital social por meio da transferência de bens imóveis dos sócios em favor da empresa nada mais significa que “adquirir”, “comprar” ou “realizar” a aquisição de uma quantidade de cotas sociais ou ações de uma empresa dando como forma de pagamento um ou mais bens imóveis de propriedade dos sócios.

O sócio adquire uma participação sobre uma determinada empresa, que é representada por cotas ou ações, e em troca transfere o seu imóvel em favor da empresa como forma de pagamento dessa compra dessas cotas ou ações. Isso pode ocorrer quando uma empresa está sendo constituída pelo sócio e para formar o seu capital social inicial utiliza o imóvel, ou então quando uma empresa já existe e o sócio pretende aumentar o seu capital social por algum motivo.

O nome jurídico que utilizamos para esse específico compromisso que o sócio assume perante a sociedade e os demais sócios de transferir o seu bem imóvel em favor da empresa se chama “subscrição”. Quando eu subscrevo cotas ou ações de uma empresa significa eu assumo o compromisso de pagar o valor nominal dessa participação em dinheiro ou com algum outro bem móvel ou imóvel que tenha valor econômico e possa ser avaliado em dinheiro. Esse é o meu compromisso, a minha obrigação assumida!

Outra coisa é o ato de pagamento em si, que se chama “integralização”! Quando eu transfiro o dinheiro ou o bem móvel ou imóvel para o nome da empresa, significa que eu estou integralizando o capital social dessa empresa. Quando eu transfiro a propriedade do dinheiro ou de algum bem que era meu como pessoa física para a empresa, e agora essa pessoa jurídica passa a ser a nova proprietária desse patrimônio, isso significa que eu estou integralizando, realizando ou formando o capital social dessa empresa e, por consequência, em contrapartida vou receber uma participação dentro dessa empresa que é representada pelas suas cotas ou ações.

Bom, esse então é o significado dessas duas expressões (subscrição e integralização) muito comuns no meio empresarial!

Mas para que serve essa transferência de bens, especialmente imóveis, em favor da pessoa jurídica que eu já sou, ou quero me tornar sócio?

Eu posso te dar três motivos para que isso seja feito, além de outros que podem depender das características específicas da empresa ou da família empresária.

Primeiro, a transferência se justifica pela utilização do bem imóvel na exploração das atividades empresariais da empresa (isto é, para o desenvolvimento do seu objeto social). Exemplo: eu tenho um imóvel e quero que nesse imóvel seja a sede da minha empresa, então eu integralizo esse bem no capital da minha empresa para que ela, pessoa jurídica, possa utilizar o imóvel. Outra situação: eu tenho um imóvel rural e quero agora fazer o parcelamento do solo através de um loteamento ou edificações. Então eu transfiro esse imóvel para uma empresa que terá como objetivo desenvolver as atividades imobiliárias de loteamento e incorporação de edificações para que esse imóvel seja explorado pela empresa, e não por mim como pessoa física. E assim sucessivamente podemos dar vários exemplos em que uma empresa pode vir a utilizar um bem imóvel na sua atividade empresarial.

Um segundo motivo para a integralização de capital com bens imóveis: “planejamento patrimonial”, que de forma mais coloquial também ficou conhecido no meio empresarial como “blindagem patrimonial”. Eu já falei disso aqui no canal e isso se justifica na medida em que eu posso segregar os riscos da atividade empresarial dentro de uma família empreendedora e, com isso, diminuir as chances de vir a perder o patrimônio particular da família (casa, apartamento, carros, fazenda, casa de praia, etc.) em razão de eventuais dívidas ou passivos dos negócios. Exemplo: uma família tem uma ou mais empresas que exploram determinada atividade empresarial. Possivelmente, no desenvolvimento desses negócios a família é obrigada a contratar funcionários, pagar impostos, tirar licenças ambientais, comprar insumos, enfim, assumir riscos para que possa, lá na frente, ganhar algum dinheiro e repartir esse lucro com os sócios. Diante desses riscos, é importante que a família separe os bens particulares dos sócios de propriedade das próprias pessoas físicas, e crie uma estrutura de separação clara transferindo esses bens para uma outra empresa destinada exclusivamente para administrar esses bens. Isso é importante para que fique claro e bem segregados quais são os bens destinados às atividades empresariais e vinculados às pessoas jurídicas que assumem aos riscos dos negócios, bens estes que inclusive podem responder pelas dívidas trabalhistas, tributárias, cíveis ou ambientais dessas empresas, daqueles outros bens pessoais dos sócios que não estão vinculados aos negócios e não devem responder por passivos das empresas em caso de cobrança de alguma dívida.

Por último, um terceiro motivo que gostaria de lembrar e que justifica a integralização de imóveis é o “planejamento sucessório”. Sobre esse tema, eu tenho um vídeo aqui no canal que explica bem o que é isso e quais são as ferramentas jurídicas possíveis de serem utilizadas para se fazer um planejamento sucessório com segurança e eficácia aqui no Brasil. Mas se você ainda não viu, te convido a assistir esse vídeo que me refiro e posso te dar o seguinte exemplo para ficar mais claro: uma família tem um ou mais imóveis e deseja partilhar em vida esses bens. Em vez de transferir esse bens para os filhos como pessoas físicas, o que pode gerar a possibilidade futura de cada um vender a sua parte à terceiros, a família tem a opção de constituir uma empresa, transferir os imóveis para essa empresa, e com isso partilhar as cotas ou ações entre os filhos, deixando todos de carta forma vinculados, unidos e com a possibilidade de preservação desses bens ao longo do tempo pela família dentro dessa nova empresa que assim constituída justamente para conservar e administrar o patrimônio familiar em conjunto.

Bom, esses foram os três motivos importantes que me referi. Percebe então como é importante a ferramenta de integralização de bens imóveis?

Mas aí você deve estar se perguntando: e os custos? Sobre as despesas, o que gostaria de lhe passar é que existe uma regra básica para a cobrança das taxas, emolumentos e os impostos para esse tipo de operação.

Naturalmente, a família terá que pagar as taxas da Junta Comercial ou Cartório de Pessoas Jurídicas para registro dos atos societários e documentação pertinente à integralização dos imóveis no capital social das empresas. Nada caro, são taxas normais inerentes à qualquer registro de Alteração de Contrato Social ou registro de Ata de Assembléia.

E também posteriormente a família terá que pagar as taxas cobradas pelo Cartório de Registro de Imóveis, que são os chamados “emolumentos”, para também fazer o registro desses atos societários e documentação pertinente perante o Cartório de Imóveis, visando a transferência da titularidade dos bens imóveis em nome das pessoas físicas para as empresas.

Mas o que você deve se preocupar são os impostos! Neste caso, o tributo que pode ser cobrado é o ITBI, chamado de “Imposto de Transmissão de Bens Imóveis” estipulado pelas Prefeituras Municipais e que giram em média de 3% sobre o valor de venda. Aqui, existe uma regra importante: se a empresa tiver como objeto social a exploração preponderante de uma atividade considerada como “imobiliária”, ou seja, a compra e venda de imóveis, locação ou arrendamento de imóveis, ou ainda, a cessão de direitos relativos aos imóveis, aí sim neste caso o ITBI será devido e a família deverá arcar com esse custo em favor da Prefeitura Municipal.

Agora, se a empresa não tiver como exploração a atividade imobiliária, aí essa operação entra numa regra específica de imunidade tributária prevista na nossa Constituição da República e então a família não terá que pagar o ITBI. Não existirá a obrigação de se pagar imposto em favor da Prefeitura local sobre a transmissão dos imóveis das pessoas físicas para as empresas. A família terá somente os custos das taxas e emolumentos da Junta Comercial e Cartórios como expliquei anteriormente.