Hoje, vamos falar sobre as sociedades limitadas unipessoais, a fim de esclarecer as seguintes dúvidas muito comuns entre os empresários e credores: é possível penhora das cotas de uma sociedade limitada unipessoal? O devedor pode ter a sua participação societária penhorada na sociedade unipessoal? O que o credor pode fazer contra o sócio de uma sociedade unipessoal para receber o pagamento da sua dívida?
Para que possamos entender melhor as repercussões que envolvem o “sócio único” de uma sociedade limitada unipessoal, importante fazermos uma breve retrospectiva da evolução legislativa que tivemos nos últimos 2 (dois) anos dentro do universo das sociedades empresárias no nosso país. Inicialmente, a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (a EIRELI) surgiu no ordenamento pátrio com o advento da Lei n. 12.441/2011, a qual incluiu os arts. 44, VI, e 980-A no Código Civil. Esses artigos possibilitaram a criação de uma empresa de sócio único, desde que cumpridas 3 (três) condições: 1) que a constituição da EIRELI deveria se dar por uma única pessoa natural proprietária da integralidade do capital social; 2) que o capital social deveria equivaler a, no mínimo, 100 (cem) vezes o salário mínimo vigente no País; e 3) que a pessoa física poderia ser titular de apenas uma única EIRELI. Posteriormente, o Governo Federal sancionou a Lei da Liberdade Econômica (Lei n. 13.874, de 20/9/2019, proveniente da conversão da MP n. 881, de 2019) que criou a sociedade limitada unipessoal (SLU), admitindo assim a constituição de uma sociedade limitada por apenas um único sócio. Essa possibilidade se deu por meio da inclusão dos parágrafos 1º e 2º no art. 1.052 do Código Civil que, porém, não exigiam para a constituição da sociedade limitada unipessoal o cumprimento daquelas 3 (três) condições que eram inerentes à constituição da EIRELI. Por isso, na prática a EIRELI logo caiu em desuso e, em seguida, o art. 41 da Lei do Ambiente de Negócios (Lei n. 14.195, de 26/8/2021, oriunda da conversão da MP n. 1.040, de 2021) veio a transformar todas as EIRELIs existentes em sociedades limitadas unipessoais, independentemente de qualquer alteração em seu ato constitutivo por parte do seu titular. Além disso, a Lei n. 14.382, de 27/6/2022 (resultado da conversão da MP n. 1.085, de 2021) revogou expressamente os dispositivos legais regentes da EIRELI que eram os arts. 44, VI, e 980-A do Código Cível. Ou seja, a partir de 2022 passamos a ter no nosso ordenamento jurídico em definitivo somente a figura da sociedade limitada unipessoal, mas tudo o que vou esclarecer neste vídeo serve tanto para as antigas EIRELIs que foram convertidas em 2021 por força de lei, quanto para as sociedades limitadas que já foram constituídas originalmente dentro desse formato. Em ambos os casos, o capital social será detido por um único titular. Existirá a concentração da integralidade dos direitos e obrigações provenientes do capital social nas mãos de um único sócio. No caso da sociedade limitada unipessoal, não importa se o capital é formado por uma cota única ou por diversas cotas, desde que fiquem sob a titularidade de um único sócio. Sendo assim, será possível que o credor venha a penhorar, no todo ou em parte, a participação societária do devedor sócio de sociedade limitada unipessoal, independentemente do capital social estar dividido ou não em cotas. Para o pagamento da dívida, o credor particular do sócio poderá penhorar as cotas do titular e pedir a liquidação parcial ou total dessa participação dentro da sociedade, com a correspondente redução do capital social. O crédito do credor particular será satisfeito com o valor arrecadado proveniente da liquidação das cotas do titular único da sociedade unipessoal. A legislação vigente permite que isso seja feito com base nos arts. 1.026 e 1.031 do Código Civil, conjugados com os arts 835, IX, 861 e 865 do Código de Processo Civil. Inclusive, recentemente tivemos o julgamento do Recurso Especial nº 1.982.730 pelo STJ que validou a penhora da participação em sociedade limitada unipessoal para pagamento de credor particular. O STJ decidiu que é possível a penhora, no todo ou em parte, da participação societária do devedor em sociedade limitada unipessoal para o pagamento de seus credores particulares, desde que se observe o caráter subsidiário da medida.