Muitas famílias utilizam a doação em vida para fazer o planejamento patrimonial e sucessório dos bens. Os Pais se valem da doação para transferir aos filhos e terceiros bens em vida conforme os seus interesses. Mas você sabia que o Código Civil impõe limites para essa transferência? Que a doação tem regras próprias? E que a concordância dos herdeiros não afasta nulidade de doação que comprometeu a parte legítima da herança?
A “doação em vida” poderá servir de ferramenta jurídica do planejamento sucessório, no qual se busca transferir de forma planejada o patrimônio da família ainda em vida em favor dos herdeiros ou de terceiros conforme interesse dos Pais. Conforme dispõe o art. 538 do Código Civil, a “doação de bens” é um ato de liberalidade feito por alguém (chamado de “doador”) em benefício de uma outra pessoa (chamada de “donatária”). Caso o doador tenha “herdeiros necessários” vivos (que são os filhos, Pais e cônjuge), ele deverá reservar a metade dos seus bens em favor desses herdeiros, formando assim uma parcela do patrimônio que chamamos de “parte legítima da herança”. A “parte legítima da herança” é uma parcela que deverá corresponder a, no mínimo, o valor equivalente a 50% (cinquenta por cento) do patrimônio total do doador, nos termos dos arts. 1.845 e 1.846 do Código Civil. O doador deverá tomar muito cuidado para não desrespeitar as regras legais no momento de realizar o ato de doação em vida para que não seja considerado nulo pela Justiça. Inclusive, recentemente tivemos no mês de março de 2025 um caso julgado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ por meio do Recurso Especial (REsp) nº 2.107.070, no qual reconheceu a nulidade absoluta da doação inoficiosa feita por meio de escritura pública de partilha em vida, ainda que os herdeiros tenham concordado na época com a divisão desigual dos bens e dado quitação mútua e plena, com renúncia a eventuais ações futuras. Isso porque o artigo 2.018 do Código Civil dispõe que a partilha, por ato entre vivos, somente será válida se respeitar a legítima dos herdeiros necessários. Por isso, o STJ deixou claro no julgamento que a doção inoficiosa é aquela que fere a parte legítima reservada aos herdeiros necessários. É a doação que extrapola os limites da parte disponível da herança, atingindo a parcela da legítima reservada obrigatoriamente aos herdeiros necessários. Como consequência, a doação inoficiosa deve ser considerada nula de pleno direito naquilo que extrapolar a parte disponível da herança. A doação que afronta a parte legítima não poderá ser validada nem mesmo pelo consentimento dos próprios herdeiros, devendo assim ser reconhecida a nulidade da parte da doação que exceder a o patrimônio disponível do doador e vier a afrontar a parte indisponível reservada aos herdeiros.